domingo, 15 de setembro de 2013

95) "A Personalidade Humana", a grande obra de Frederic Myers

Frederic Myers

     Enquanto nos países latinos, o principal nome do Espiritismo é o seu codificador Allan Kardec, com sua obra básica, "O Livro dos Espíritos", nos países de língua inglesa o nome mais citado é o do inglês Frederic Myers, com seu livro "A Personalidade Humana e Sua Sobrevivência à Morte Corporal". Mas enquanto o livro de Kardec é, essencialmente, uma grande obra filosófica, com diversas implicações morais e religiosas, o trabalho de Myers é essencialmente científico, com algumas considerações morais em seu epílogo. Há, no Brasil, uma tradução  resumida da obra de Myers, com 348 páginas, intitulada "A Personalidade Humana", publicada pela Edigraf, sem indicação de data e tradutor. Pesa contra o trabalho de Myers o seu estilo, algo rebuscado e complexo (ele era um literato), o que torna um pouco complicadas certas passagens do seu livro. Não tenho elementos para julgar acerca da qualidade da tradução. Contudo, em linhas gerais e do ponto de vista científico, o livro é muito bom. 
     De minha parte, já havia escrito sobre Myers e suas ideias nos artigos 62 e 63 deste blog, que indico aos leitores mais interessados, e no anterior a este. Complemento minhas referências a ele através de alguns excertos da sua obra principal, "A Personalidade Humana", tradução brasileira.

     O "eu" consciente de cada um de nós ou, designando-o melhor, o "eu supraliminar" (porque situado acima do limiar da nossa consciência) não pode compreender a totalidade da nossa consciência e de nossas faculdades. Existe uma consciência mais vasta, com faculdades mais profundas, da qual a consciência e as faculdades desta vida se desenvolveram em consequência de uma seleção. A maioria dessas faculdades permanecem latentes durante a vida terrena, e só se restabelecem em toda a sua plenitude depois da morte.
     Cheguei lentamente a esta conclusão, que tomou para mim a forma atual há uns 14 anos, como consequência de profundas reflexões baseadas em provas que se multiplicavam progressivamente. Trata-se de um conceito que foi até agora considerado como exclusivamente místico. Se eu agora me dedicar a dar-lhe uma base científica, não terei a oportunidade de poder formulá-lo em termos definitivos, nem de apoiá-lo com a ajuda de bons argumentos, que só uma experiência mais extensa é capaz de fornecer. Mas o valor deste conceito aparecerá aos olhos do leitor, se examinar a sucessão das diferentes provas expostas neste livro. ( - )
     Por outro lado, designo por "eu subliminar" a parte do "eu" que permanece abaixo do limiar da consciência, e admito que possa existir não só cooperação entre essas duas correntes de pensamento quase independentes, mas também mudanças de nível e variações da personalidade, de tal forma que o que está sob a superfície pode chegar à superfície e manter-se ali de maneira mais ou menos provisória ou permanente. E considero, por fim, que todo "eu" do qual possamos ter consciência nada mais é do que um fragmento do "eu" mais vasto que de cada vez se revela, modificado e limitado por um organismo que não permite a sua manifestação plena e completa. ( - )
     No nosso estudo, encontraremos um grupo de fenômenos que nos mostrará esses afloramentos subliminares, os impulsos e as comunicações que chegam das camadas profundas da personalidade às camadas superficiais, diferindo, com frequência, pela sua qualidade, de todo elemento conhecido de nossa vida supraliminar ordinária. São diferentes porque implicam numa faculdade da qual não tivemos nenhum conhecimento precedente, e por serem produzidos num meio do qual não tivemos até hoje ideia alguma.
     Toda a minha obra visa a justificar esta ampla afirmação. De fato, a telepatia, percepção de pensamentos sem a intervenção dos órgãos sensoriais conhecidos, e a telestesia, visão de cenas à distância, sugerem uma incalculável extensão de nossas faculdades mentais e uma influência exercida sobre nós por espíritos mais livres, menos embaraçados que o nosso. ( - )
     Podemos, então, influenciar-nos mutuamente à distância pela telepatia. E se os nossos espíritos encarnados podem trabalhar assim, de um modo independente, pelo menos na aparência, do organismo material, temos então uma presunção a favor da existência de outros espíritos independentes dos corpos e suscetíveis de nos influenciarem da mesma maneira. ( - )
     No capítulo VI, estudaremos os aquilo que os autores franceses chamam de "alucinações verídicas". Encontraremos então fenômenos que parecem ter sua origem num espírito estranho ao do sensitivo. E mostraremos que esta origem deve ser antes buscada em espíritos de outras pessoas vivas, o que nos levará a passar em revista as diferentes formas de telepatia. Mas o conceito de telepatia, por sua própria natureza, não deve estar limitado aos espíritos ainda presos a um corpo, e teremos provas a favor das comunicações diretas entre os espíritos encarnados de um lado, e os espíritos desencarnados do outro. ( - )
     Francis Bacon previu a vitória progressiva da observação e da experimentação, o triunfo do fato real e analisado em todos os domínios do saber humano; em todos, menos em um. Com efeito, abandonou à Autoridade e à Fé o domínio das "coisas divinas". Desejo mostrar que esta grande exceção não está justificada. Acho que existe um método de chegar ao conhecimento dessas coisas divinas com a mesma certeza e segurança tranquila que devemos aos progressos no conhecimento das coisas terrestres. A autoridade das religiões e das igrejas será, dessa forma, substituída pela observação e a experimentação. Os impulsos da fé se transformarão em convicções racionais e solucionadas, que farão nascer um ideal superior a todos os que a humanidade concebeu até hoje. ( - )      
     Observemos a história positiva da Civilização Ocidental. Na época em que as múltiplas crenças locais, rituais, disseminadas como soluções parciais de problemas cósmicos, destruíam-se mutuamente por simples contato e fusão, produziu-se um acontecimento que, nos reduzidos anais da civilização humana, em seus albores, pode ser considerado como ímpar. Foi vivida uma vida durante a qual a resposta mais alta que o instinto moral humano jamais recebera, viu-se corroborada por fenômenos que todo o mundo, por falta de conhecimentos específicos, considera milagrosos, e dos quais a Ressureição foi a expressão culminante.( - ).
     O cristianismo repousa, incontestavelmente, sobre uma base formada por fatos observados. Estes fatos, tal como nos transmitiu a tradição, tendem seguramente a provar o caráter super-humano do fundador do cristianismo e seu triunfo sobre a morte, e, ao mesmo tempo, a existência e a influência de um mundo espiritual, que é a verdadeira pátria do homem. Todos reconhecem que essas ideias se encontram na origem da fé. Mas desde os primórdios, o cristianismo foi elaborado em códigos morais e rituais adaptados à civilização ocidental, e creem alguns que adquiriu, como regra de vida, o que perdeu como simplicidade espiritual. ( - )
     Qual é o sistema que nos forneceu uma confirmação tão profunda da própria essência da revelação cristã? Jesus Cristo gerou "a vida e a imortalidade". Por sua aparição após a morte corporal, provou a imortalidade do espírito. Por seu caráter e seus ensinamentos, provou a paternidade de Deus. Tudo o que sua mensagem continha de dados demonstráveis estão aqui demonstrados; todas as suas promessas de coisas indemonstráveis para a época, estão aqui comprovadas. Aventurar-me-ei a uma opinião e a predizer que, graças aos novos dados que possuímos, todos os homens inteligentes e ponderados acreditarão, em futuro próximo, na ressureição do Cristo, enquanto que, sem esses dados, quase ninguém acreditaria nela jamais. ( - )
     Nossos recentes conhecimentos confirmam, dessa forma, as antigas correntes de pensamento, de um lado corroborando o relato da aparição do Cristo após a morte, e nos fazendo ver, de outro, a possibilidade de uma encarnação benfazeja de almas que, antes de sua encarnação, eram superiores à do homem. Isto relativo ao passado. E no que diz respeito ao futuro, confirmam o conceito oriental de uma infinita evolução espiritual à qual se submete todo o Cosmos. Ao mesmo tempo, revestindo-se de um caráter de realidade cada vez mais pronunciado,o fato de nossa comunicação com os espíritos libertos nos proporciona um sustentáculo imediato e nos deixa entrever a perspectiva de um desenvolvimento infinito, que consistirá num acréscimo da santidade, numa interpenetração cada vez mais íntima dos mundos e das almas, numa evolução da energia e da vida na tríplice concepção da sabedoria, do amor e da felicidade. Este processo, que se realiza de uma maneira diversa para cada alma em particular, é, em si mesmo, contínuo e cósmico, porque a vida, que nasce da energia primitiva, diviniza-se, para se converter na felicidade suprema.

     Concluo com um texto, sobre Myers, emitido pelo psicólogo suíço Théodore Flournoy, já por mim citado no artigo nº 62: "Se futuras descobertas científicas vierem a confirmar a tese espírita de Myers, o seu nome será inscrito no livro de ouro dos iniciados, e junto aos de Copérnico e Darwin, completará a tríade de gênios que mais profundamente revolucionaram o pensamento da humanidade, nas ordens cosmológica, biológica e psicológica."
     

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