sábado, 19 de setembro de 2020

128) A síntese psíquica de Myers, ampliada por Geley, e rematada por Bozzano (parte 2)

Gustave Geley          Ernesto Bozzano 
 

     
    



Geley (em suas obras "Resumo da Doutrina Espírita" e "O Ser Subconsciente") foi mais longe do que Myers em sua síntese psíquica. Postulou que o subliminar inferior é o passado transposto, e o subliminar superior é o futuro a alcançar. O primeiro é uma conquista, o segundo uma promessa. Mas enquanto Myers parecia ver no subliminar inferior um mergulho até, no máximo, o feto no ventre materno, Geley ia muito além. Ele via naquele um imenso repositório, onde estavam depositadas, em camadas sucessivas, todas as personalidades, cada vez mais imperfeitas (indo no sentido do passado remoto) que o ser espiritual havia vivido ao longo de uma lenta e progressiva evolução durante milhares de anos (Geley era reencarnacionista), desde o desabrochar da consciência, em múltiplas e inumeráveis existências sucessivas, cada vez mais perfectíveis, até sua aproximação à Consciência Divina, culminando finalmente na unificação com Ela. Em realidade, esta grande marcha evolutiva foi primeiramente formulada pelo engenheiro Gabriel Delanne, continuador de Kardec para a parte científica do Espiritismo, em sua obra pioneira "A Evolução Anímica", publicada em 1895.
     
     Um professor de filosofia da ciência na universidade de Turim, Itália, que havia sido discípulo do filósofo inglês Herbert Spencer, Ernesto Bozzano, pretendeu concluir o remate da ciência e filosofia espíritas. Bozzano encontrou uma equivalência entre os sentidos materiais preexistentes no feto e os sentidos espirituais preexistentes na subconsciência humana. Ele escreveu:
     "Se o feto humano, no ventre materno, tem que sobreviver à crise do nascimento, deve possuir, preexistentes e em estado latente, os sentidos da vida terrestre, destinados a emergir e atuar em ambiente terrestre, depois da crise do nascimento, pois tais sentidos materiais (visão, audição, olfato, paladar e tato) não poderiam ser criados súbita e magicamente do nada no instante do nascimento".
     "Analogamente, se o espírito humano tem que sobreviver à crise da morte, os sentidos da vida espiritual já devem existir, preformados e em estado latente, na subconsciência humana, prontos para emergir e atuar em ambiente espiritual, depois da crise da morte, pois tais sentidos espirituais não poderiam ser criados súbita e magicamente do nada no instante da morte. Donde se conclui que, se na subconsciência humana não existissem faculdades paranormais, dever-se-ia concluir, de forma inapelável, que o espírito humano é aniquilado com a morte do corpo. Enfim, podemos finalizar com a afirmação de que as faculdades paranormais da subconsciência (memória integral, telepatia, clarividência) são os sentidos espirituais do "eu" integral integral subconsciente (ou "eu" espiritual), preexistentes e em estado latente na subconsciência humana, aguardando apenas, para emergir e atuar, o ambiente apropriado, que sucede à crise da morte". 
     "Por maneira que à pergunta que me foi feita pelo Congresso Espiritualista Internacional de Glasgow, e que constitui o título desta obra, respondo: nem Animismo, nem Espiritismo, logram, isoladamente, explicar o conjunto dos fenômenos paranormais. Ambos são imprescindíveis a tal fim, pois são efeitos de uma causa única, e essa causa é o espírito humano, que, quando age, em momentos fugazes, durante a existência encarnada, determina os fenômenos anímicos, e quando age, no mundo dos vivos, durante a existência desencarnada, determina os fenômenos espíritas. Com efeito, Animismo e Espiritismo são complementares um do outro, pois tudo o que pode fazer um espírito desencarnado, também poderá fazê-lo - embora menos bem - um espírito encarnado, sob a condição, porém, de que se ache numa fase transitória de enfraquecimento vital, fase que corresponde a um processo incipiente de desencarnação do espírito, quais se verificam, por exemplo, durante o sono fisiológico, sono sonambúlico, sono mediúnico, êxtase, delíquio, narcose, estados comatosos, etc.; e se verifica, experimentalmente que, de fato, são estas as condições para que ocorram os fenômenos chamados anímicos: telepatia, clarividência, etc.. Tudo indica, então, havermos chegado à solução legítima do grande problema, pois se apresenta como resultante da convergência de todas as provas que promanam da análise comparada dos diferentes tipos de fenômenos paranormais -- anímicos e espiríticos".

127) A síntese psíquica de Myers, ampliada por Geley, e rematada por Bozzano (parte 1)

      Frederic Myers

     Relendo mais acuradamente o livro do ilustre parapsicólogo francês (anti-espírita) René Sudre, intitulado "Tratado de Parapsicologia" (Zahar Editores, 1976, 458 páginas), inspirei-me em alguns textos dele para extrair excertos relativo aos autores Myers e Geley, embora um tanto modificados, para melhor ressaltar o que julgo ser a tese fundamental dos mesmos. Declaro ainda que o texto do filósofo Ernesto Bozzano eu o retirei de seu livro, "Animismo ou Espiritismo? Qual deles explica os fatos?", extraordinária síntese da obra de 40 anos do "grande mestre da ciência da Alma".

     De todos os psicólogos, o inglês Frederic William Henry Myers (em seu livro, "A Personalidade Humana") foi o primeiro e, ainda hoje, quase o único, que tentou uma síntese do conjunto dos fatos parapsíquicos, como atesta a filosofia espiritualista do francês Gustave Geley, que dela resultou. A nova e importante teoria do "Eu Subliminar" sintetiza a teoria psicológica de Myers. 
     Os fatos do hipnotismo, de dissociação da personalidade, de automatismo, dos sonhos durante o sono fisiológico, etc., mostraram desde muito que o inconsciente do homem não era somente o fisiológico, mas que também era preciso admitir a existência de uma atividade mental inconsciente ou, para ser mais explícito, de uma atividade subconsciente. Tomando por empréstimo o vocábulo criado para as necessidades da Psicofisiologia, o "umbral da consciência", Myers distinguiu um "eu supraliminar" (isto é, situado acima do limiar da consciência, o nosso "eu consciente"), e um "eu subliminar" (isto é, situado abaixo do limiar da consciência, o "eu subconsciente"), eu subliminar muito mais amplo e, em alguns casos, superior. Em realidade, há um só eu, cuja consciência supraliminar (normal) não é mais que um fragmento, fragmento esse que é responsável pela atividade prática do nosso dia-a-dia. 
     Aqui, Myers faz uma comparação com o fenômeno de dispersão da luz solar branca por um prisma ótico. O eu supraliminar corresponderia à estreita faixa visível do espectro, que vai do vermelho ao violeta. Aquém do vermelho, nas regiões de baixa frequência, há o infravermelho, que corresponde ao subliminar inferior, e que é responsável, por exemplo, pelos sonhos triviais que ocorrem durante o sono fisiológico. Além do violeta, nas regiões de alta frequência, há o ultravioleta, que corresponde ao subliminar superior, e que é responsável pelas funções psíquicas mais elevadas, tais como a genialidade, o êxtase místico, e as faculdade paranormais (telepatia, clarividência, e, às vezes, precognição). Assim, como mostra a comparação do espectro, o subliminar está longe de ser homogêneo.
     Os dois "eus", supraliminar e subliminar, são separados por um "diafragma psíquico". Quando se enfraquece o controle do "eu supraliminar", elementos do subliminar podem atravessar aquele diafragma. É o que ocorre nos nossos sonhos. Contudo, em casos mais raros e graves, podem dar origem às neuroses. Isto porque, para Myers, o subliminar inferior é dependente do funcionamento de certos centros cerebrais ordinariamente inconscientes. Por outro lado, quando afloram estratos do "eu subliminar" superior, temos, como afirmamos, a eclosão das criações do gênio, dos êxtases místicos, e das faculdades de ordem paranormal. O "eu subliminar" superior (que, em sua integralidade, constitui o verdadeiro "eu" sobrevivente à morte do corpo) participa de um mundo espiritual e, nesse mundo, ele age de modo autônomo, independentemente das limitações da vida orgânica, exercendo normalmente suas funções de telepatia e clarividência. A prova fundamental é dada pela telepatia no mundo dos vivos. De fato, para Myers, a telepatia entre dois espíritos encarnados, com independência dos órgãos sensoriais, é logicamente continuada pela telepatia entre encarnados e desencarnados.