sexta-feira, 27 de agosto de 2010

63) A noção dos "eus subliminares", segundo Frederic Myers (1843-1901) - 2ª parte

Frederic Myers


Em seu livro "A Farsa Escura da Mente", uma resposta do escritor espírita Carlos Imbassahy ao livro "A Face Oculta da Mente", do trêfego e caricato Padre Oscar Quevedo, à pág. 199, Edicel Ltda., há trechos esclarecedores sobre o Hipnotismo. Escreve Imbassahy:

"Quem fala em hipnose, fala em sugestão. A sugestão, afirmava Bernheim, é a chave de todos os fenômenos do hipnotismo. Atualmente, dizia Boirac, todos os médicos, todos os estudiosos que se ocupam da questão, inclinam-se fortemente a pensar como Bernheim, que a sugestão é a chave dos fenômenos da hipnose, ou mesmo, que não há hipnose quando não há sugestão".
"Braid, para quem o hipnotismo era de origem física, compreendeu mais tarde que ele era de origem sugestiva. São do mesmo parecer Liégeois e toda a escola de Nancy; Pitres, de Bordeus, e Delboeuf, já em 1891, declaravam: não há hipnotismo, senão diversos graus de sugestibilidade; e Hartenberg: não falemos de hipnotismo, mas de sugestão. Para o Professor Forel, de Zurich: tudo é sugestão no hipnotismo. O Professor Masius declarava: Já sei o que se passa na Salpetrière -- era tudo exercício e sugestão, não há hipnotismo senão graus e modos diversos de sugestibilidade. E Bertrand: tudo é sugestão aplicada. O Dr. Van Velsen: tenhamos como certo que no fundo de todas as manobras dos hipnotizadores, encontra-se a sugestão".
"Define o Dicionário de Psicologia, de Warren -- Um estado tendente a aguçar a sugestibilidade. E o nosso patrício Dr. Osmar Andrade: seria Liébault um dos primeiros a conceituar a ideia de sugestão. Nasceram as primeiras obras colocando a sugestão em plano de destaque na gênese do fenômeno hipnótico".

Entretanto, em estágios bem mais avançados de sono ou hipnose, emerge um "eu" mais profundo: uma fração, provavelmente, do eu subliminar superior, de Myers, que outro não seria senão o eu espiritual, ou eu integral subconsciente (expressão de Bozzano); este, quando emerge, não é mais sugestionável, isto é, não aceita representar personalidades que não sejam a sua própria, e já apresenta um rudimento de faculdades paranormais, quais sejam: captação dos pensamentos dos assistentes (telepatia), visão a distância através dos corpos opacos (clarividência), fenõmenos de desdobramento, e, em casos mais raros, de precognição.
Os antigos magnetizadores chamavam esse estágio mais avançado de "sonambulismo lúcido".

Ponhamos um exemplo tomado do livro de Gabriel Delanne, "A Alma é Imortal", Editora do Conhecimento, pág. 48:

Eis alguns trechos de Chardel que nos dão, ao mesmo tempo, esclarecimentos sobre as relações dos sonâmbulos com o mundo desencarnado e sobre o estado da alma do paciente durante o sonambulismo:

"Um dia, quando a sonâmbula Adéle Lefrey ditava ao seu magnetizador algumas prescrições terapêuticas, ele lhe perguntou em tom estranho:
-- A senhora ouve perfeitamente quem está receitando?
-- O senhor não o ouve?
-- Não, não ouço, nem vejo ninguém.
-- Ah, claro! -- retrucou ela -- O senhor está dormindo, quem está acordada sou eu."

Ante os protestos do doutor, de que poderia despertá-la do sono sonambúlico quando bem entendesse, a sonâmbula responde:

" -- O senhor está dormindo, repito; eu, ao contrário, estou quase tão completamente acordada quanto todos estaremos um dia. Explico-me: tudo que o senhor pode ver atualmente é grosseiro, material; o senhor só lhe distingue a forma aparente, mas as belezas reais lhe escapam, ao passo que eu, em quem as sensações corporais estão momentaneamente suspensas, em quem a alma está quase totalmente livre dos seus entraves ordinários, eu vejo o que aos seus olhos é invisível, ouço o que seus ouvidos não podem ouvir, compreendo o que para o senhor é incompreensível....... Quando quero, ouço um ruído produzido ao longe, sons que partem e se espalham a cem léguas daqui; resumindo, não preciso que as coisas venham a mim, posso ir até elas, onde quer que estejam, e delas fazer uma apreciação muito mais correta do que outra pessoa, que não esteja num estado igual ao meu, poderia fazer."

62) A noção dos "eus subliminares", segundo Frederic Myers (1843-1901) - (1ª parte)

Frederic Myers


Frederic William Henry Myers (mais conhecido simplesmente como Frederic Myers), foi um poeta, ensaísta, escritor e psicólogo inglês, professor da Universidade de Cambridge, mais conhecido por suas pesquisas psíquicas, tendo fundado, com alguns amigos, em 1882, a Sociedade de Estudos Psíquicos de Londres. Foi considerado o pilar básico dessa Sociedade. Em 1886, publicou, juntamente com Edmond Gurney e Frank Podmore, um livro que se tornaria célebre e que abriria todo o campo para as pesquisas psíquicas (ou parapsicológicas, como se diz hoje): os "Phantasmas of the Living" (Fantasmas dos Vivos), logo traduzido para o francês sob o título transformado de "Hallucinations Télépathiques" (Alucinações Telepáticas). Quando começou os estudos psíquicos era um materialista irredutível, mas suas convicções nesse campo foram lentamente evoluindo até se tornar um convicto da sobrevivência do espírito humano. Sua obra póstuma sobre esse assunto foi publicada em 1903, dois anos após sua desencarnação, reunindo os seus últimos escritos. Seu título é "The Human Personality and it's Survival of Bodily Death" (A Personalidade Humana e sua Sobrevivência à Morte Corporal), em dois grossos volumes de 1360 páginas ao todo, reunindo todas as sua pesquisas e conclusões sobre os fenômenos psíquicos. Dele disse Theodore Flournoy, afamado psicólogo suíço, professor da Universidade de Genebra, inteiramente avesso à teoria espírita: Se futuras descobertas científicas vierem a confirmar a tese espírita de Myers, o seu nome será inscrito no livro de ouro dos iniciados, e junto aos de Copérnico e Darwin, completará a tríade de gênios que mais profundamente revolucionaram o pensamento da humanidade, nas ordens cosmológica, biológica e psicológica. (Apud Carlos Imbassahy, O Espiritsmo à Luz dos Fatos, ed. FEB, pág.180).
Há uma tradução ultra-resumida da grande obra de Myers para o português, intitulada A Sobrevivência Humana, pela Edigraf - S. Paulo, com 348 páginas. Destaco, à pág. 28, o seguinte e importante texto:

"A ideia de limiar (Schwelle) da consciência, de um nível que um pensamento ou uma sensação devem ultrapassar para entrar na vida consciente, é tão simples quanto familiar. A palavra subliminar que significa o que está sob o limiar, já foi empregada para designar as sensações demasiadamente débeis para serem diferenciadas individualmente. Proponho estender o sentido deste termo, de modo a ser empregado para designar tudo o que se encontra sob o limiar comum ou, se convier, fora do limite comum da consciência. Não só estes estímulos débeis, que a própria debilidade obriga a ficarem submersos, por assim dizer, mas também muitas outras coisas semelhantes que a Psicologia atual apenas percebe. Sensações, pensamentos, emoções que podem ser fortes, definidas e independentes, mas que, em virtude da constituição mesma de nosso ser, emergem raramente nessa corrente supraliminar de nossa consciência, ou consciência normal, em que nos identificamos a nós mesmos. Como reconheço que essas emoções e pensamentos submersos possuem as mesmas características das que associamos com a vida consciente, acredito-me autorizado a falar de uma consciência subliminar que, como veremos, manifesta-se, por exemplo, por meio de frases escritas ou faladas tão complexas e tão coerentes que se diriam ditadas pela consciência supraliminar. Como considero, por outro lado, que esta consciência subliminar não é descontínua ou intermitente, mas como existem processos subliminares isolados, comparáveis aos processos supraliminares isolados (como quando um problema é resolvido durante o sonho, mediante um processo desconhecido), existe também uma série contínua de lembranças subliminares (ou melhor, de uma corrente) que implicam o mesmo gênero de revivescência individual e persistente de impressões antigas e de reações às impressões novas que caracteriza o que ordinariamente chamamos de eu, sinto-me autorizado a falar dos eus subliminares, ou, abreviadamente, de um eu subliminar.

Esse eu subliminar pode se apresentar sob dois aspectos: o eu subliminar inferior, dependente do funcionamento de centros cerebrais ordinariamente inconscientes, que se manifesta, por exemplo, nos nossos sonhos (sendo, por isso, também chamado de eu onírico), e nos fenômenos hipnóticos; ele é altamente sugestionável, isto é, representa passivamente todos os tipos ou personalidades que a vontade do hipnotizador lhe queira impor. Tomemos alguns exemplos ao Prof. Charles Richet em seu livro A Grande Esperança, ed. LAKE, pág. 126:

"Hipnotizo uma senhora, minha parenta, respeitável e idosa, mãe de família muito religiosa, e lhe sugiro que é uma atriz, uma dançarina. Diz-me ela então: -- Você está vendo esta saia, meu bem, foi o diretor que me obrigou a encompridá-la. Que pena! Quanto mais curta, melhor fica. Como cacetes são esses diretores!... Você é muito tímido com as mulheres! Vá à minha casa às 3 horas. Poderemos conversar porque estarei só... Digo-lhe depois que é general. Então, imediatamente, ela assume um ar marcial, dá ordens, cai por terra, imaginando-se ferida durante uma batalha".
"A uma outra mulher, um modelo de ateliê, sugiro que se transforme em general. Ela assume um ar completamente diferente. Pede um vinho, jura, fuma, encoleriza-se contra um oficial. Sugiro que a mesma mulher se transforme em pasteleiro, a saber, um determinado indivíduo com o qual, tempos atrás, estando a seu serviço, ela teve uma séria contenda; toma então, resolutamente, o partido desse pasteleiro contra ela própria. Depois, eu lhe sugeri que iria fazer-lhe uma operação e cortar-lhe a mão. Eis, disse-lhe eu, o sangue que corre. Foi quando fiquei horrivelmente assustado, porque ela teve uma síncope e caiu".
"Algumas vezes, as personificações se tornam de tal forma intensas e ridículas que hesitamos em narrá-las. Sugeri a meu amigo Ferrari que se transformasse em papagaio. Ele me diz, então, seriamente: -- Será que posso comer o milho que se acha em minha gaiola? O estado de credulidade foi bem denominado por De Rochas como uma das condições do sonho".
(Fim da 1ª parte)