sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

84) Animismo ou Espiritismo? Qual deles explica os fatos?

  
     Segundo alguns estudiosos, as duas obras mais importantes da ciência espírita são "Animismo e Espiritismo" (1890, trad. de C. S., ed. FEB), do sábio russo Alexandre Aksakof, e "Animismo ou Espiritismo?" (1937, trad. de Guillon Ribeiro, ed. FEB), do filósofo italiano Ernesto Bozzano. Aliás, esta última, Bozzano nunca teve ideia de escrever, como ele próprio informa no seu prefácio:

     "Devo, antes de tudo, informar o leitor acerca das origens e da natureza do presente livro, que não é uma obra nova no verdadeiro sentido do termo, e que jamais tive ideia de escrever. Eis como se passaram as coisas."
     "O Conselho Diretor do Congresso Espírita Internacional, que se reuniu na cidade de Glasgow (Escócia) na primeira semana de setembro do corrente ano (1937), me escreveu, convidando-me a dele participar pessoalmente, oferecendo-me o cargo honorífico de vice-presidente do mesmo Congresso, e pedindo que lhe eu enviasse um resumo da minha obra, em torno do tema: Animism or Spiritualisme? Which Explains the Facts? ("Animismo ou Espiritismo? Qual Deles Explica os Fatos?"). Formidável tarefa, pois que se tratava de resumir a maior parte da minha obra de 40 anos. Mas, de súbito, o tema se me apresentou teoricamente muito importante. Aceitei então, sem hesitar, o convite e, como escasso era o tempo e vasta a tarefa, pus-me a reunir todas as minhas publicações sobre o assunto: livros, monografias, opúsculos, artigos em revistas e jornais, lançando-me sem demora ao trabalho."
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     "Como quer que seja, agora que concluí, muito me alegra que o Conselho Diretor do Congresso de Glasgow me haja levado a resumir-me a mim mesmo, porquanto da síntese de muitas publicações minhas, longas, breves, de ocasião, condensadas num livro de pequeno porte, surge, incontestável, a solução espirítica do mistério do Ser."
     
     Vejamos o que nos diz o psiquista italiano nas conclusões do seu livro:

     "O presente trabalho, embora seja apenas um resumo substancial de numerosas publicações minhas sobre o tema que me sugeriu o Conselho Diretor do Congresso Espírita de Glasgow, não deixa de revestir notabilíssimo valor teórico, porquanto da síntese de múltiplas publicações condensadas num livro de pequeno porte, faz ressaltar longa série de importantes conclusões secundárias, ou de categoria, tiradas das manifestações paranormais -- anímicas e espiríticas -- em todas as suas graduações. Conquanto de ordem particular, essas conclusões convergem, em imponente massa cumulativa, para uma conclusão solene, de ordem geral: a solução espirítica da formidável questão pesquisada pela nova ciência que se chama -- Metapsíquica." ( Hoje Parapsicologia -- obs. minha).
     "Não me parecendo oportuno repetir aqui todas as conclusões de ordem secundária a que cheguei, limitar-me-ei a recordar apenas três delas, de importância fundamental."
     "Em primeiro lugar, lembro haver demonstrado que as faculdades paranormais subconscientes não podem ser os germens de novos sentidos destinados a surgir e fixar-se de forma permanente na humanidade do futuro, e isso pelas múltiplas razões que aduzi baseado nos fatos, mas, principalmente, porque tudo concorre a provar que a posse de sentidos paranormais não se conciliaria com a natureza humana, de modo que as instituições civis, sociais, morais, longe de retirarem daí qualquer vantagem, seriam abaladas em seus fundamentos, anuladas, demolidas, dando em resultado que a evolução psíquica da espécie pararia, degenerando, por não mais funcionar a grande lei biológica da luta pela vida."
     "Uma vez conseguida essa demonstração, aplanado estava o caminho para o conhecimento da verdadeira natureza das faculdades paranormais em apreço, faculdades que são os sentidos espirituais da personalidade integral subconsciente, os quais existem, preformados, em estado latente, nos recessos da subconsciência, aguardando o momento de emergir e atuar no meio espiritual, depois da crise da morte, do mesmo modo que os sentidos terrenos existem, preformados, em estado latente, no embrião (no ventre materno), esperando o momento de emergir e atuar no meio terreno, depois da crise do nascimento."
     "Por outras palavras: se é indispensável que o embrião humano, destinado a viver e a atuar no meio terreno, tem de aí chegar provido de sentidos apropriados e preformados, prontos a exercitar-se depois da crise do nascimento, igualmente indispensável há de ser que o Espírito desencarnado tenha de chegar ao meio espiritual provido de sentidos apropriados e preformados, prontos a ser utilizados depois da crise da morte, porque não é possível que os sentidos espirituais sejam criados subitamente do nada no instante da morte. Segue-se que, se o Espírito sobrevive, tem que os possuir preformados, em estado latente, prontos a entrar em relação com o novo meio que o acolhe. Se assim não fosse, o Espírito não sobreviveria à morte do corpo. Donde se depreende que os fenômenos anímicos são os que facultam ao homem a prova mais solene e incontestável da sobrevivência."
     "E ouso esperar que os opositores que me lerem haverão de recordar-se, no futuro, de que toda vez que se aventurarem a combater a hipótese espirítica recorrendo aos poderes da subconsciência, ainda que amplificados a enormes latitudes, nada mais farão, realmente, do que demonstrar a existência e a sobrevivência da alma, com o se colocarem no ponto de vista do Animismo, antes que no do Espiritismo, o que, precisamente, vem a dar no mesmo. Com efeito, sob esse aspecto, não cabe aos fenômenos espiríticos senão aduzirem a prova complementar, embora de si importante, da mesma demonstração."
     "Em segundo lugar, lembro que ficou demonstrado já ser possível circunscrever-se, dentro de limites bem definidos, os poderes paranormais da subconsciência, poderes designados pelos nomes de clarividência no espaço e no tempo, telepatia, psicometria, telemnésia (esta última no sentido de leitura nas subconsciências de outros, sem limites de distância), demonstração cuja consequência é privar os opositores da hipótese espirítica da mais formidável arma de que dispunham para combatê-la, e de que se prevaleciam até ao absurdo."
     "Em terceiro lugar, lembro que também ficou demonstrado que, mesmo quando se admita -- a título de concepção teórica -- que as faculdades subconscientes possuem o atributo divino da onisciência, não se conseguiria neutralizar a possibilidade de obter-se um dia a prova científica da sobrevivência humana, possibilidade solidissimamente firmada no conjunto inteiro das manifestações paranormais -- anímicas e espiríticas -- e não apenas sobre as provas de identificação espirítica fundada nas informações pessoais fornecidas pelos desencarnados que se comunicam, conforme presumem constantemente os nossos opositores."
     "Evidente, portanto, se faz que a solução, no sentido aqui indicado, das três questões fundamentais em apreço, equivale à solução do problema do Ser em sentido espiritualista, donde se segue que o Animismo prova o Espiritismo, e de tal modo que, sem o Animismo, o Espiritismo careceria de base."
     "Ao mesmo tempo e como complemento das conclusões a que cheguei, discuti a fundo, nos capítulos 3 e 4, respectivamente, os casos das comunicações mediúnicas entre vivos e os fenômenos de bilocação, duas categorias de manifestações teoricamente importantíssimas por corroborarem as referidas conclusões, em sentido espiritualista."
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     "Em realidade, o capítulo 5 é o mais importante do presente livro, porquanto nele se demonstra, baseada em fatos, a assertiva de que, ainda que se concedesse a onisciência divina à subconsciência humana, não se chegaria a anular a possibilidade de provar-se cientificamente a sobrevivência. Ora, assim sendo, lícito se torna afirmar que o material de fatos por mim reunido e comentado nesse capítulo, derroca todas as hipóteses e todas as objeções, legítimas ou sofísticas, de que dispõem os opositores, fazendo triunfar a causa da verdade por maneira teoricamente resolutiva. Digo teoricamente, porque, praticamente, haverá sempre os grupos dos irredutíveis, que descrevi nas conclusões do aludido capítulo, os quais, embora não consigam refutar o que ali se contém, se manterão do mesmo modo recalcitrantes ou céticos, devido à existência bastante conhecida de uma forma de idiossincrasia psíquica que torna impermeáveis as vias cerebrais a novas verdades (misoneísmo, ou aversão a ideias novas)."
    
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     "Concluo, epilogando as resultantes obtidas e o faço em forma de resposta à questão que me submeteu o Conselho Diretor do Congresso Espírita Internacional de Glasgow: "Animismo ou Espiritismo? Qual deles explica os fatos?". Respondo: "
     "Nem um nem outro, pois que ambos são indispensáveis à explicação do conjunto dos fenômenos paranormais, cumprindo se observe, a propósito, que eles são efeitos de uma causa única: o espírito humano que, quando se manifesta, em momentos fugazes, durante a existência encarnada, determina os fenômenos anímicos e, quando se manifesta, na condição de desencarnado, no mundo dos vivos, determina os fenômenos espiríticos. Decorre daí um importante ensinamento: que os fenômenos metapsíquicos, considerados em conjunto, podem ser anímicos ou espiríticos, conforme as circunstâncias. É racional, com efeito, supor-se que o que um Espírito desencarnado pode realizar, também deve podê-lo -- embora menos bem -- um Espírito encarnado, sob a condição, porém, de que se ache em fase transitória de diminuição vital, fase que corresponde a um processo incipiente de desencarnação do Espírito (sono natural, sono sonambúlico, sono mediúnico, êxtase, delíquio, narcose, coma, etc.)."


      Abaixo estão as obras, publicadas em volume, de Ernesto Bozzano (1862 - 1943). Esta relação foi estabelecida, em 1941, pelo grande amigo de Bozzano, o médico, e também psiquista Gastoni de Boni (1908 - 1986), e foi colhida no livro "Povos Primitivos e Manifestações Paranormais (Editora do Conhecimento, 2011), de Bozzano, com apresentação de de Boni. De Boni sustenta que se toda a obra de Bozzano, aí incluídos os artigos por ele escritos em diversos jornais e revistas especializadas de várias partes do mundo, fossem fundidos num só volume, chegar-se-ia a algo em torno de 15.000 páginas.
     No final do livro "A Alma nos Animais", publicado pela editora Golden Books (uma tradução do 11º livro listado na relação abaixo, reformulado e aumentado por Bozzano em 1941), cheguei a contar 243 trabalhos do pensador italiano, entre aqueles que figuram abaixo, mais monografias e artigos publicados em diferentes jornais e revistas de Metapsíquica e Espiritismo científico. Eis a relação apresentada por de Boni:

  1) O Espiritismo Diante da Ciência - 1901
  2) Hipótese Espirítica e Teoria Científica - 1903
  3) Casos de Identificação Espirítica - 1909
  4) A Propósito da "Psicologia e Espiritismo", do prof. E. Morselli -1909
  5) Fenômenos Premonitórios - 1912
  6) Fenômenos de Assombramento - 1917
  7) Fenômenos de Telestesia - 1920
  8) Os Enigmas da Psicometria - 1921
  9) Fenômenos de Telecinésia em Relação com Eventos de Morte - 1922
10) Música Transcendental - 1922
11) As Manifestações Metapsíquicas e os Animais - 1923
12) Comunicações Mediúnicas Entre Vivos - 1924
13) Fenômenos de Obsessão e Possessão - 1926
14) Manifestações Paranormais Entre os Povos Selvagens - 1926
15) A Propósito da Introdução à Metapsíquica Humana - 1927
16) Pensamento e Vontade, Forças Plásticas e Organizadoras - 1927
17) Premonições, Precognições, Profecias - 1927
18) Primeiras Manifestações de "Voz Direta" na Itália - 1929
19) A Crise da Morte nas Descrições dos Desencarnados Que se Comunicam - 1930
20) Algumas Variedades Teoricamente Interessantes de Identificação Espirítica - 1930
21) Aparições de Mortos no Leito de Morte - 1930
22) Literatura de Além Túmulo - 1930
23) Visão Panorâmica ou Memória Sintética na Iminência da Morte - 1931
24) Gemas, Amuletos e Talismãs - 1931
25) Fenômenos de Transportes - 1931
26) Crianças Videntes e Visões de Mortos - 1931
27) Marcas e Impressões de Mãos de Fogo - 1931
28) William Stainton Moses e a Crítica Científica - 1931
29) A Propósito das Revelações Mediúnicas - 1931
30) A Propósito de Espíritos Materializados e de Revelações Transcendentais - 1931
31) Materializações de Espíritos em Proporções Minúsculas - 1932
32) Criptestesia e Sobrevivência - 1932
33) Telepatia e Psicometria em Relação à Mediunidade da Sra. Piper - 1933
34) Simbolismo e Fenômenos Metapsíquicos - 1933
35) Xenoglossia (Mediunidade Poliglota) - 1933
36) Breve História das Pancadas Mediúnicas - 1933
37) Em Defesa dos Fenômenos Mediúnicos de Efeitos Físicos - 1933
38) Fenômenos de Bilocação - 1934
39) Fenômenos de Transfiguração - 1934
40) Experiências Mediúnicas e Eventos de Morte Relativos aos Fenômenos de Assombramento - 1935
41) Manifestações Olfativas de Ordem Patológica, Telepática, Paranormal - 1936
42) Telepatia, Telemnésia e a Lei da "Relação Psíquica" - 1938
43) Personalidades Mediúnicas Que Sugerem Personalidades Subconscientes - 1940
44) Romancistas de Gênio e Heróis de Roma Considerados em Relação com a Pesquisa Psíquica - 1940
45) A Faculdade Paranormal - 1940
46) Pesquisas Sobre as Manifestações Paranormais - 1931 (Vol. 1)
47) Idem - 1931 (Vol. 2)
48) Idem - 1932 (Vol. 3)
49) Idem - 1933 (Vol. 4)
50) Idem - 1938 (Vol. 5)
51) Idem - 1940 (Vol. 6)
52) Animismo ou Espiritismo? - 1938 


sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

83) Fenômenos de "xenoglossia" -- provas irrefutáveis da sobrevivência espiritual

Ernesto Bozzano
     
     Nenhuma evidência concorre tanto para a demonstração da sobrevivência espiritual e da possibilidade da comunicação entre os dois mundos (o dos chamados vivos e o dos desencarnados) quanto os fenômenos de "xenoglossia". O filósofo e cientista Ernesto Bozzano escreveu o melhor e mais decisivo trabalho sobre o tema: "Xenoglossia" (ed. da Federação Espírita Brasileira, trad. de Guillon Ribeiro). Vejamos as primeiras palavras da sua introdução:

     "O termo xenoglossia foi proposto pelo professor Richet para definir a "mediunidade poliglota", isto é, o fenômeno pelo qual os médiuns falam ou escrevem em línguas que eles ignoram totalmente e, às vezes, ignoradas de todos os presentes."
     O grande mestre da ciência da alma, como era chamado, divide os fenômenos em 4 categorias: 1ª - Casos com o "automatismo falante"; 2ª - Casos com o "automatismo escrevente"; 3ª - Casos por meio da "voz direta"; 4ª - Casos por meio da "escrita direta". São, ao todo, 35 casos escrupulosamente comprovados e estudados um a um pelo método científico, sempre empregado pelo filósofo italiano: análise comparada e convergência das provas.
     Em alguns casos, surgem línguas, dialetos e "patuás" extintos há muitos anos, como, por exemplo -- as linguas "hierática", tártaro-pérsica, chinesa antiga (da época de Confúcio"), inglesa antiga do 17º século, etc., e que consumiram tempo e recursos a especialistas para serem traduzidas.
     Nas concusões do seu trabalho, e a fim de que não paire nenhuma dúvida, Bozzano reanalisa, uma por uma, todas as 7 hipóteses levantadas pelos céticos (que ele chama "animistas totalitários", segundo uma terminologia clássica proposta pelo sábio russo Alexandre Aksakof em sua grande obra "Animismo e Espiritismo") para infirmar a teoria espirítica e lhe atribuir uma causa puramente humana, e demonstra a inanidade sofística de cada uma delas.
     A 1ª é a hipótese da "criptomnésia" ou memória esquecida, a 2ª é a hipótese da "telemnésia" ou "clarividência telepática", a 3ª é a hipótese da "clarividência propriamente dita" sob a forma de "leitura a distância em livros fechados", a 4ª é a hipótese da "personalidade desdobrada" válida para os casos obtidos por meio da "voz direta", a 5ª é a hipótese da "memória ancestral", a 6ª é a hipótese metafísica da existência de um "reservatório cósmico das memórias indivduais", e, finalmente, a 7ª, a mais absurda de todas, é a hipótese ultrametafísica de que os médiuns se poriam em relação com o Absoluto, isto é, com Deus, proposta pelo filósofo Von Hartmann, e que foi refutada pelo Conselheiro de Estado russo A. Aksakof, em sua obra já citada.
     Nas suas conclusões, referindo-se a esta 7ª hipótese, assevera o pensador italiano: 
     "Em face dessa incomensurável audácia teórica (relação dos médiuns xenoglóssicos com o Absoluto), uma só coisa me competia: confessar-me teoricamente vencido... desde que se tratasse de uma hipótese racional. Tenho, com efeito, que me considerar vencido, porquanto sendo a onisciência, a onipresença e a onipotência os atributos do Ente Supremo, nada se poderia negar ao Absoluto e nada haveria impossível para quem conversa com o Absoluto."
     "Em realidade, Hartmann imaginou que os médiuns se pusessem em comunicação direta com a Consciência Cósmica, atributo do Ente Supremo, e dela extraíssem os pormenores ou os conhecimentos linguísticos de que necessitassem para enganar o próximo, sendo tudo feito, naturalmente, com a magnânima aquiescência do mesmo Ente Supremo. Ora, esta hipótese não se revela apenas absurda, mas blasfema. Com efeito, ela culmina num absurdo filosófico, porquanto sustenta que um minúsculo ser finito, de inteligência limitada, chamado homem, pode conversar familiarmente com o Ser Infinito, Impessoal e Eterno, criador do Universo, e que o pode fazer exclusivamente com o fim de mistificar o próximo !"
     "Apresso-me a acrescentar, em homenagem ao equilíbrio mental dos nossos opositores, que nenhum deles saiu a propugnar essa incomensurável heresia filosófica. Tais as hipóteses que têm sido formuladas para, de qualquer modo, explicarem-se os fenômenos de xenoglossia."
    
     Antes de prosseguir com os argumentos de Bozzano neste seu trabalho, abro uns parênteses para mencionar outro texto seu, extraído do livro "Matapsíquica Humana" (ed. da FEB, trad. de Araújo Franco):
     "Devemo-nos lembrar de que, se para compreender uma língua não é necessário que o médium a conheça, por lhe bastar perceber telepaticamente as vibrações do pensamento do consulente, o mesmo não se dá quando se trata de falar essa língua. Neste caso, indispensável se torna a conheça o médium, pois a telepatia e a clarividência são de todo impotentes para suprir os necessários conhecimentos, dado que a estrutura orgânica de uma língua é pura abstração, que não se pode ver nem perceber nos cérebros alheios."
     "Teríamos de admitir que o médium, graças ao seu próprio poder paranormal, pudesse, de um momento para outro, tornar-se conhecedor dos vocábulos correntes de uma língua, das variações de gênero, número, caso e tempo, assim como das principais regras da gramática, pelas quais lhe fosse possível agrupar, dispor, coordenar as frases, apoderar-se da fonética especial de cada palavra, das características da língua ou do dialeto, das inumeráveis locuções e idiotismos que constituem o fermento vivo de cada idioma. E será isto possível? Não posso crer haja quem, com o único fim de evitar uma outra explicação simples, natural, emergindo espontaneamente dos fatos (dado que o próprio fenômeno se apresenta como proveniente de um desencarnado), ouse defender tese tão extravagante."

     Fechados os parênteses, voltemos ao livro "Xenoglossia", em que o mestre italiano finaliza, entrando em mais uma polêmica com seu amigo e adversário, Prof. Charles Richet (Prêmio Nobel de Medicina), posto que, como sempre, de forma serena e elevada:

     "O professor Richet, cujas ideias sempre estudo com grande deferência e proveito, depois de haver sinceramente reconhecido que algumas categorias de manifestações matapsíquicas, inclusive a que faz objeto deste trabalho, não podem explicar-se por nenhuma hipótese naturalística, se refugia... nos pósteros, com esta observação":
    
     Ainda nem uma só hipótese temos, verdadeiramente séria, a tomar em consideração. Creio, em definitivo, numa hipótese desconhecida, que de futuro aparecerá ! Não posso formulá-la porque não a conheço.
(Tratado de Metapsíquica, pág. 790).

     "Com todo o respeito devido ao insigne homem de ciência, de cuja amizade muito me honro, digo parecer-me que essa observação se reduz, no fundo, a uma engenhosa "frase de efeito", carente de consistência real, visto que, presentemente, com as hipóteses acima apreciadas, já se há percorrido toda a gradação, legítima e ilegítima, possível e impossível, das presunções hipotéticas que a mais desenfreada fantasia pudera excogitar.  Pois não vieram à baila até a Consciência Cósmica e o Absoluto? Ir além não é possível, nem agora nem nunca. Entretanto, o fato é que, com toda essa audaciosíssima sequela de hipóteses, não se chegou à explicação naturalística dos fenômenos de xenoglossia, nem mesmo buscando-se refúgio no Absoluto. Não há quem não veja que esse resultado negativo fala com extraordinária eloquência a favor da única hipótese capaz de explicar o conjunto dos fatos."
     "Isto posto, observarei que a verdade, a tal respeito, consiste em que, no tocante à categoria dos fenômenos de xenoglossia, as possibilidades teóricas existentes para a solução do grande problema da gênese dos mesmos fenômenos, podem resumir-se no seguinte dilema: ou está provado que a subconsciência humana possui o dom da onisciência divina e, consequentemente, pode conversar ou escrever em todas as línguas, sem as conhecer; ou, ao contrário, está demonstrado que, quando o médium conversa ou escreve numa língua que lhe não seja conhecida, não é ele quem isso faz, mas a entidade do desencarnado que se declara presente."
     "É assim que a grande questão se põe e não há outra maneira de pô-la. Segue-se daí que, como podemos ter a certeza de que os pósteros não chegarão nunca a demonstrar que a subconsciência humana possui o dom da onisciência divina, lícito nos é antecipar aos vivos de hoje, sem temor de que os pósteros algum dia nos desmintam, a auspiciosa notícia de que a grande questão já se acha resolvida, favoravelmente à interpretação espiritualista dos fatos."
     "Por outras palavras: ressalta evidente que, como os pósteros não chegarão nunca a demonstrar o que, racionalmente, psicologicamente, filosoficamente, é impossível de demonstrar-se, então, se há de admitir que a primeira proposição do dilema formulado resulta absurda e insustentável, devendo, nesse caso reconhecer-se que a solução integral da grande questão se contém na segunda proposição do mesmo dilema, visto que não existe uma terceira proposição. Sobre este último ponto, estou absolutamente seguro do que afirmo, e desafio quem quer que seja a demonstrar que me acho em erro."
     "Razão, pois me assistia quando, na introdução do presente trabalho, afirmei que as manifestações de xenoglossia se contam entre as mais importantes da fenomenologia metapsíquica, por isso que eliminam de um só golpe todas as hipóteses de que dispõe quem queira tentar-lhe a explicação sem se afastar dos poderes paranormais inerentes à subconsciência humana. Da minha afirmação deriva, como consequência, que a interpretação dos fatos, no sentido espiritualista, se impõe agora de modo racionalmente inevitável. Quer isto dizer que, por obra dos fenômenos de xenoglossia, se tem que considerar provada a intervenção de entidades espirituais extrínsecas ao médium e aos presentes, nas experiências mediúnicas.
     "Assim é, mas, ao mesmo tempo, apresso-me a declarar que sou o primeiro a reconhecer, em consciência, que largo tempo ainda passará antes que essa grande Verdade, subversora da civilização de uma época e iniciadora de uma nova época na História do mundo, consiga evolver, amadurecer, aclimatar-se e impor-se à Humanidade, o que é um bem."
     "Quando Galileu anunciou ao mundo a extraordinária descoberta, subversora da ciência astronômica do seu tempo, segundo a qual a Terra era uma esfera que rodava em torno de si mesma e girava em torno do Sol, um século foi preciso de lutas, antes que a estupenda verdade se generalizasse e obtivesse universal acolhimento. Outrotanto sucederá, porém com lentidão notavelmente maior e lutas muito mais rudes, respeito a esta outra verdade, que se apresenta muitíssimo mais importante, cientificamente, filosoficamente, moralmente e socialmente, do que todas as verdades que, no passado, no presente e no futuro, se hajam imposto ou venham a impor-se à meditação dos homens."
     "Conclui-se daí que os poucos privilegiados que hoje conhecem o Verdadeiro e lograram assimilá-lo (pois que não conhecê-lo, sendo necessária uma mentalidade madura para o assimilar), esses poucos privilegiados de hoje podem considerar-se os eleitos do destino.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

82) O extraordinário caso Rosemary - Lady Nona: uma prova da sobrevivência espiritual

     Retiro as considerações abaixo do livro "A Psicografia Ante os Tribunais", 4ª ed., FEB, 1961, pág. 165:

     Mais notável, espantoso mesmo, é o caso da velha linguagem egípcia, que ressurge depois de 3.000 anos, na sua forma, na sua sonoridade, trazendo à luz vários problemas linguísticos, desvendando mistérios que pareciam impenetráveis, visto que jaziam soterrados pelo tempo, pelo pó, em companhia dos sarcófagos dos velhos faraós. Tudo surgiu a lume. O passado se fêz presente, instantaneamente, assombrosamente.
     Trabalhava com o Dr. Wood notável médium cujo pseudônimo era Rosemary. Por ela se manifestava um Espírito que dava o nome de Lady Nona, dizia ter vivido no Egito havia longos séculos. Fornecia, a princípio, recordações pessoais, uma exata descrição de instrumentos musicais da época, pormenores sobre a cidade de Mênfis, os faraós, as cerimônias religiosas, a Esfinge, e pitorescas descrições sobre a vida do povo egípcio da época. Tudo se comprovou após exaustivo trabalho de idas e vindas a museus e documentos históricos.
     Inopinadamente, Nona, o Espírito, que falava o inglês, entrou a discorrer na antiga linguagem egípcia, de todos desconhecida. A médium ouvia sons, falados numa língua ignorada. O Dr. Wood entrou a procurar um egiptólogo, e conseguiu travar conhecimento com o Sr. Howard Hulme, de Brighton, familiarizado com o idioma dos faraós. Nunca se conheceram antes. Centenas de frases foram ditadas pela individualidade espiritual, e o Dr. Hulme julgou que deveria se tratar de um idioma esquecido há muitos séculos, remontando ao antigo Egito, provavelmente à 18ª dinastia, 1576 anos antes da era cristã.
     O Dr. Wood apanhava os ditados conforme os sons e os remetia ao Dr. Hulme. Este, mais tarde, devolvia o trabalho traduzido em hieróglifos egípcios, acompanhados da tradução em inglês. O mais interessante - acrescenta Wood - é que as respostas correspondiam sempre, de maneira espantosa, às nossas perguntas à Entidade, feitas em inglês, e ao assunto de que tratávamos. Tal é, num rápido escorço, o que nos refere desenvolvidamente o Dr. Wood, no periódico "Two Worlds", em 14 de outubro de 1932. O Dr. Wood publicou um estudo do caso num livro intitulado - "The Rosemary Records", Manchester, 1932.
     A respeito, escreve o General Peter, numa revista científica alemã, "Zeitschrift für Seelenleben", pág. 57:
     Há três anos, Rosemary é "controlada" por Lady Nona, princesa que esposou, há 3.000 anos, o faraó Amenhotep III, o qual a fêz afogar no Nilo. Posteriormente, tomado de remorsos, o uxoricida arrependeu-se profundamente da sua atitude. História incrível, mas o Dr. Wood procurou provas. A descrição dos instrumentos de música do tempo de Amenhotep foi verificada, depois de inquérito e pesquisas. O retrato do monarca, feito pelo Espírito, coincidia com o do existente no British Museum. As indicações históricas eram perfeitas, conforme se descobriu. A faraona fala em seu idioma, e o Sr. Hulme, distinto especialista em dialetos do antigo e moderno Egito, pôde verificar e fiscalizar minuciosamente este portentoso caso de xenoglossia.
    
J. J. Prudhon, referindo-se a outro trabalho de Wood sobre o caso, explica:
     Trata-se da história de Lady Nona, concubina do faraó Amenhotep III. Nona procurou estabelecer sua identidade por mais de 300 provas linguísticas, em puro egípcio antigo, falado e foneticamente registrado pelo autor, e traduzido em inglês pelo egiptólogo Sr. Howard Hulme ("Revue Spirite", 1935, pág. 399).
     Foram a mais de 800 as mensagens egípcias. Delas trata amplamente e mais profundamente o Dr. Wood, no seu último livro -- "Ancient Egypt Speaks" -- e, em português, o Sr. F. V. Lorenz, em seu livro -- "A Voz do Antigo Egito" (ed. FEB).

Obs. minha: sobre este caso, pode-se consultar também o livro do erudito escritor brasileiro Hermínio C. Miranda -- "Arquivos Psíquicos do Egito" (ed. Lachâtre).
  

81) O sábio russo Alexandre Aksakof presencia a materialização do Espírito Katie King, antes de Sir William Crookes

Alexandre Aksakof

William Crookes
   
     Alexandre Aksakof -- o sábio russo e incansável pesquisador dos fenômenos psíquicos, pois viajou meio mundo para estudá-los; Conselheiro de Estado de Sua Majestade, o Imperador (Czar) de todas as Rússias, Alexandre III; doutor em filosofia; professor de línguas estrangeiras na Academia Alemã de Leipzig (falava 8 línguas correntemente); fundador e diretor de duas das melhores revistas com que a imprensa espírita já contou: "Psychische Studien", na Alemanha e "Rebus", na Rússia; tradutor de diversas obras estrangeiras para o alemão e o russo, cujo nome se aureolou do respeito e da admiração de todos os chamados metapsiquistas -- narra em sua grande obra "Animismo e Espiritismo", traduzida para todas as línguas cultas do mundo, uma completa e brilhante refutação às teses antiespíritas do filósofo alemão Eduardo von Hartmann, o fenômeno de materialização do Espírito Katie King, antes dos célebres experimentos, com esses mesmos fenômenos, do notável físico-químico inglês, Sir William Crookes. Conta-nos Aksakof em sua obra:
     "Farei aqui uma breve digressão, narrando a minha entrevista com Katie King, entrevista que ainda não foi publicada pela imprensa estrangeira. Em 1873, o Sr. Crookes tinha publicado os seus artigos sobre a força psíquica, porém, não acreditava ainda nos fenõmenos de materialização, e dizia que só acreditaria nesses fenômenos quando visse, ao mesmo tempo, o médium e a forma materializada. Achando-me em Londres, nessa época, desejei naturalmente presenciar esse fenômeno, e fui graciosamente convidado para assistir à sessão que se devia realizar a 22 de outubro."
     "Reunimo-nos em um pequeno aposento que servia de sala de jantar. A médium, Srta. Florence Cook, sentou-se em uma cadeira, no canto formado pelo fogão e a parede; atrás havia uma cortina corrediça; o Sr. Luxmoore, que dirigia a sessão, exigiu que eu examinasse bem o local e as ligaduras da médium, pois pensava ser esta última precaução sempre indispensável. Em primeiro lugar, ligou ele cada uma das mãos da médium, separadamente, com uma fita de linho, selou os nós, depois, reunindo as mãos por trás das costas, ligou-as conjuntamente com as extremidades da mesma fita e, de novo, selou os nós; depois, ligou-as ainda com uma longa fita, que fêz passar por fora da cortina, por baixo de um gancho de cobre, que foi preso à mesa perto da qual estava sentado; deste modo, a médium não podia mover-se sem imprimir um movimento à fita. O aposento estava iluminado por pequena lâmpada, colocada atrás de um livro."
     "Ainda não havia decorrido um quarto de hora e a cortina foi afastada suficientemente, para deixar ver uma forma humana, em pé, vestida completamente de branco, com o rosto descoberto, mas tendo os cabelos envolvidos com um véu branco, e as mãos e os braços nus -- Era Katie. Na mão direita ele segurava um objeto, que entregou ao Sr. Luxmoore, dizendo-lhe: É para o Sr. Aksakof; eu lho ofereço. Ela me oferecia um pote de doce! E a entrega desse presente provocou um riso geral. Como se vê, a nossa primeira entrevista nada teve de místico. Tive a curiosidade de perguntar donde vinha esse pote de doce e Katie deu-me esta resposta, não menos prosaica que o presente: Da cozinha. Durante toda essa sessão, ela conversou com as pessoas presentes e andou de um lado para o outro; a sua voz era abafada; só se percebia um ligeiro cochicho; repetia a todo instante: -- Façam-me perguntas, perguntas sensatas; então, perguntei-lhe: -- não poderás mostrar-me a tua médium? Ela me respondeu: -- Sim, venha ligeiro e olhe.

     Imediatamente, com Katie a minha frente, atravessei as cortinas das quais eu estava apenas afastado 5 passos; a forma branca tinha desaparecido, e, diante de mim, em um canto escuro, avistei a médium, sempre sentada na cadeira; trajava vestido de seda preta e, assim, não pude vê-la distintamente na escuridão. Logo que voltei ao meu lugar, Katie tornou a aparecer saindo do gabinete e perguntou-me: -- Viu bem? -- Não muito bem, respondi; -- estava escuro atrás da cortina. -- Então segure a lâmpada e olhe depressa, respondeu-me Katie. Em menos de um segundo, precedido por Katie, coloquei-me atrás da cortina, com a lâmpada na mão; todo vestígio de Katie tinha desaparecido, e eu me achava em presença da médium, que estava sentada na cadeira, com as mãos ligadas por trás e mergulhada em profundo sono."
     "A luz da minha lâmpada, caindo sobre o seu rosto, produziu o efeito costumeiro: a médium gemeu, fazendo esforços para acordar; saí rapidamente do gabinete e ouvimos um interessante colóquio travar-se, atrás da cortina, entre a médium, que queria acordar completamente, e Katie, que queria adormecê-la ainda; ela, porém, teve que ceder; Katie saiu do gabinete, despediu-se dos assistentes, voltou ao gabinete e se fêz silêncio; a sessão estava terminada."
     "O Sr. Luxmoore convidou-me a examinar bem as ligaduras, nós e selos; tudo estava intacto; quando tive de cortar os laços, senti grande dificuldade para introduzir a tesoura sob as fitas, tão fortemente tinham sido atados os punhos. Examinei de novo, detidamente, o gabinete, logo que a Srta. Cook o deixou... Para mim, era evidente que não fôramos joguete de mistificação por parte da Srta. Cook. Mas, então, donde tinha vindo e por onde havia desaparecido essa forma branca, viva, falante -- uma verdadeira personalidade humana?"
     "Lembro-me muito bem da impressão que experimentei nesse dia. Eu estava certamente preparado para ver essas coisas, entretanto, custou-me acreditar nos meus olhos. O testemunho dos sentidos, a lógica mesmo, me forçavam a crer, enquanto a razão a isso se opunha, tanto é verdade que a força do hábito subjuga os nossos raciocínios. Entre os meus escritos, encontro esta nota que se relaciona com a época das experiências em questão: Confesso que as sessões da Srta. Cook me impressionaram vivamente; de um lado, eu hesitava em crer nos meus olhos; entretanto, a evidência dos fatos, as condições em que se produziram, obrigavam-me a aceitá-los. ( - )
     "Katie cumpriu a sua promessa de deixar-se fotografar. Ninguém suporia, nessa época, que essas experiências fotográficas seriam feitas pelo Sr. William Crookes, descrente ainda dos fenômenos de materialização. Durante a conversa que tive com Crookes, após a sessão relatada, pediu ele a minha opinião sobre essas manifestações. Respondi-lhe que me via forçado a considerá-las autênticas. E ele observou: -- Nenhuma ligadura me fará crer nesse fenômeno; a meu ver, a ligadura não oferece embaraços à força psíquica que age; não me darei por convencido enquanto não vir, ao mesmo tempo, a médium e a forma materializada." (Obs. da editora: Crookes convenceu-se, pois obteve essa prova posteriormente: -- Tenho a mais absoluta certeza, diz o ilustre sábio, de que a Srta. Cook e Katie são duas individualidades distintas, pelo menos no que diz respeito aos seus corpos; ver o seu livro, cujo título em português é, "Fatos Espíritas").

Obs. minha: Sir William Crookes (1832-1919) foi um físico e químico inglês, célebre pelos seus trabalhos nessas disciplinas, entre os quais avultam: a descoberta de um novo elemento químico, o tálio (nº atômico 81); a invenção dos tubos chamados tubos de Cookes, base da radiografia, onde estudou as propriedades dos raios catódicos; a descoberta da cintilometria e a construção do espintariscópio; a construção de outro aparelho de medição científica, o radiômetro, além de outros trabalhos sobre espectroscopia, radioatividade, meteorologia, etc..

sábado, 20 de outubro de 2012

80) A propósito da obra "Psicologia e Espiritismo", do prof. Enrico Morselli.

Enrico Morselli

Ernesto Bozzano

     
     Este é o título de mais uma obra (dentre as mais de cem que escreveu) do filósofo, cientista e pensador italiano Ernesto Bozzano, cognominado "o grande mestre da ciência da alma", o "primus inter pares" na análise e evisceração dos fenômenos parapsicológicos (ou espiríticos), em réplica a um livro do professor, médico e psiquiatra italiano Enrico Morselli, em 2 volumes, intitulado "Psicologia e Espiritismo", de quem, apesar de tudo, Bozzano era grande amigo, e com quem participou, no "Circulo Científico Minerva", em Gênova, de vários experimentos com a médium napolitana Eusápia Paladino, mas também com outros médiuns. Morselli era um materialista irredutível e, apesar dos impressionantes fenômenos a que assistiu (inclusive e várias vezes, de materialização), que narra, com minúcias de detalhes nos 2 volumes de seu trabalho, permaneceu um cético inabalável, por toda a vida, atribuindo todos os fenômenos a poderes ocultos, latentes no cérebro dos médiuns. Mas, sem embargo, apesar do seu ceticismo quanto à causa dos fenômenos, deixou, nessa obra, um eloquente e incisivo testemunho no que tange à veracidade dos fenômenos espiríticos. Eis como ele se refere aos mesmos:

"
A questão do Espiritismo foi discutida por mais de cinqüenta anos, e embora ninguém possa prever neste momento quando isso vai ser resolvido, todos são acordados em atribuir a ela uma grande importância entre os problemas que deixou como legado pelo século XIX para o XX. Se durante muitos anos a ciência acadêmica desvalorizou toda a categoria de fatos que o Espiritismo trouxe para formar os elementos de seu sistema doutrinário, tanto pior para a ciência. E pior ainda para os cientistas que ficaram surdos e cegos diante de todos ante a afirmação, não de sectários crédulos, mas de graves e dignos observadores como Crookes, Lodge e Richet. Eu não me envergonho de dizer que eu próprio, na medida do meu modesto poder, tinha contribuído para esse ceticismo obstinado, até ao dia em que estava habilitado para quebrar as cadeias em que os meus preconceitos absolutistas tinham ligado meu julgamento."

     Nos 2 volumes do seu documentado trabalho, Morselli comprova a realidade dos mais diversos fenômenos físicos do mediunismo, mas, negando-lhes a causa espiritual, se deixa empolgar e chega mesmo, em algumas passagens, a lançar mão de termos pesados e quase insultuosos aos espiritistas. Bozzano, com a lógica, elegância e maestria de sempre, põe por terra, um a um, os principais argumentos antiespiríticos de Morselli. Limitar-me- ei aqui a citar as palavras iniciais e finais do grande mestre italiano, em sua réplica ao prof. Morselli. (O livro de Bozzano foi publicado em 1935 pela Federação Espírita Brasileira, com tradução do Dr. Guillon Ribeiro). Vejamos então:
     
     "Sobre a obra do prof. Morselli já a crítica, a esta hora, se exercitou amplamente, realçando-lhe qualidades e defeitos. É fora de dúvida que se trata de um trabalho vigoroso, que não interessa pouco à causa das pesquisas psíquicas, contribuindo, sobretudo, pelo interesse que desperta (quem o diria!) o declarado antiespiritismo de que o autor se fêz porta-bandeira, para que aquelas pesquisas conquistem numerosos prosélitos nas fileiras, até agora hostis, dos representantes do saber."
     "Assim sendo, hesitei longamente em tentar pelo menos a crítica sumária dos múltiplos argumentos que o ilustre psiquiatra acumulou contra a hipótese espirítica. Já a seu tempo havia eu refutado alguns deles no capítulo das conclusões do meu recente livro -- Casos de Identificação Espirítica -- e deliberara não tomar em consideração outros, tanto mais que esses outros se me afiguravam, na sua maioria, tão evidentemente sofísticos, que como tais seriam facilmente discerníveis por quem quer que fosse mesmo mediocremente versado no assunto. Essa minha deliberação, porém, veio a mudar de súbito, devido ao modo insistente pelo qual o prof. Morselli vai proclamando pelas revistas a validez inconcussa da sua tese e, ao mesmo tempo, estigmatizando a pusilanimidade dos propugnadores da hipótese espirítica, por não ousarem afrontar-lhe as objeções mais importantes."
     "Disponho-me, pois, à tarefa ingrata de confutar os argumentos principais, em sentido antiespirítico, que os dois volumes da obra em questão contêm, e me lisonjeio de que o prof. Morselli, a quem não agradam as blandícias, não me ficará querendo mal por isso. No interesse de tudo aquilo que lhe parecia ser a verdade, ele não hesitou em manifestar francamente e com vivacidade o seu pensamento, pondo de lado todo respeito humano, e fêz bem. Valho-me da mesma liberdade. A cada um a sua tarefa, uma vez que é lei de todo progresso humano que a verdade, para refulgir, precisa do entrechoque das ideias."
     "Longo, entretanto, se mostra o caminho, pelo que entro, sem mais preâmbulos, no assunto."
 

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     "Chegado ao termo das minhas observações críticas, lanço para trás o olhar e meço o caminho percorrido, a fim de verificar se a formidável artilharia que o prof. Morselli fêz troar contra os propugnadores da hipótese espirítica realizou a ameaça de destruição dos seus acampamentos, que são os por mim explorados. Nada, entretanto, descubro aí mudado; tudo ao derredor se conserva tranquilo e por toda parte se percebem indícios do prelúdio de uma avançada em toda linha. Evidentemente, aquela extensa fila de "bocas de fogo" troou, dando festivas salvas, como que a anunciar aos povos o advento de uma grande Ideia, capaz de fundir numa só todas as confissões religiosas e de dar paz às consciências, com o transformar em certeza científica a fé no além túmulo." 
     "E ouso esperar que o prof. Morselli se dignará de me fazer a justiça de reconhecer que não bati em retirada diante de nenhuma das suas mais formidáveis objeções, o que, aliás, é dever de todo aquele cujo objetivo máximo seja, através da Verdade, chegar à Verdade. Se, pois, entre as objeções de que, por excessivamente inócuas, não cuidei, alguma haja que assim não pareça ao prof. Morselli, queira ele benevolamente apontar-ma, e eu a refutarei. E se entre as que tomei em consideração, de alguma se lembra que lhe pareça insuficientemente discutida, queira advertir-me que a considerarei de novo, porquanto me sinto absolutamente seguro de mim, graças, é certo, não ao meu mérito, mas à qualidade da causa que defendo."
     "A facilidade com que ficaram esclarecidas ou explicadas contradições teóricas aparentemente formidáveis evidencia quão imprudente é fundar-se uma pessoa em perplexidades de tal natureza, que não faltam em qualquer ramo de pesquisas, para lançar anátemas "a priori" contra resultados de fatos, sem refletir que fatos não são opiniões, nem podem ser suprimidos em virtude de dificuldades teóricas, que lhes tornam, num ou noutro ponto, obscura a interpretação, dificuldades que, como o ensina a experiência, se acham destinadas a resolver-se, mediante o prosseguimento das pesquisas."
     "Em outros termos: por si só, a circunstância de existirem essas insurreições teóricas contra uma hipótese fundada em fatos nunca poderá servir de fulcro para se lhe contestar a validez, mas, apenas para justificar, a seu respeito, uma suspensão de juízo. É nesse sentido que terá de se pronunciar quem quer que entenda não se deva ainda sancionar a hipótese espirítica. Foi assim que procederam, diante dela, muitos eminentes homens de ciência, desde William Crookes até Sidgwick, desde Maxwell até Bottazzi. Assim, entretanto, não procedeu o prof. Morselli."
     
     Vários anos depois, numa polêmica com o psiquista materialista René Sudre, Bozzano assim se pronunciou:

     "Estou preparado para esta discussão, por muitos anos de pesquisas e estudos metódicos, severos, sistemáticos, de natureza nitidamente científica e, sobretudo, imparcial, pois durante a mocidade, militei nos ramos do positivismo materialista, defendendo com vigor, nas revistas especializadas, as minhas convicções filosóficas de então, o mesmo vigor que ora demonstro na defesa de uma causa diametralmente oposta, porém infinitamente mais reconfortante. A lembrança desse passado materialista me faz hoje ser indulgente e tolerante com todos os antagonistas que, de boa fé, sustentam ser possível demolir o multiforme e complexo edifício de provas que conseguimos erigir -- provas de ordem anímica e espirítica -- todas convergentes, como um bloco monolítico, para a demonstração da existência e sobrevivência do espírito humano." 

79) O Inabitual na Biologia - Curas Inacreditáveis

     
     Este é o título do Capítulo I, Livro II, Segunda Parte, pág. 93, ed. LAKE, 1956, da obra intitulada "A Grande Esperança", do médico, fisiologista e professor catedrático de Fisiologia da Sorbonne, Prêmio Nobel de Medicina, Charles Richet, criador da Metapsíquica (hoje Parapsicologia). Escreve o saudoso mestre:
     "Eis um fato assinalado por Duchatel e Warcollier (Les Miracles de la Volonté, Paris, Durville, 1913, págs 89 a 96)." 

"A Srta. B., com 28 anos de idade, órfã. Um irmão morto de tuberculose com a idade de 8 anos. Ela também está tuberculosa, e tem que se recolher definitivamente ao leito em abril de 1905. No fim do ano, três médicos chamados em consultas separadas fazem o mesmo diagnóstico: 1º -  perda absoluta de sensibilidade e de movimento dos membros inferiores; 2º -  inchação extrema do abdome, com muitas dores, tornando impossível a palpação; 3º -  respiração diminuída dos dois lados, estertores do lado esquerdo e ruídos submaciços; 4º -  sensibilidade aguda na região vertebral e a coluna apresentando uma curvatura convexa a esquerda."
     "Estado geral: emagrecimento e fraqueza extrema, perda de apetite, constipação pertinaz, insônia por lesão da coluna vertebral, tuberculose pulmonar e peritonial, estado gravíssimo."
     "A 28 de janeiro de 1906, o Dr. Levy vai ver essa pobre mulher, concluindo que não há esperança alguma de cura. Ela está inerte no leito, somente os braços conservam alguns raros movimentos, e pode ligeiramente virar a cabeça do lado direito. Mas assim que se lhe levanta o corpo, a cabeça pende pesadamente. Não se pode sentá-la no leito, a coluna não tem firmeza alguma. Cada um de seus movimentos provoca uma síncope, o ventre está muito crescido e as alças intestinais distendidas desenham-se sob a parede abdominal."
     "Em desespero de causa, chamou-se então o Sr. Emile Magnin para experimentar um tratamento pelo magnetismo. A Srta. B. contou-lhe isto: A 18 de fevereiro, às duas horas da manhã, minha lâmpada apagou-se duas vezes. Ouvi então uma voz, vinda do quarto vizinho: -- Podes tu suportar a prova? E eu respondi: -- sim !"
     "Então aproximou-se de mim uma fina mão, alongada, segurando uma flama que iluminou todo o quarto e pude ler estas palavras: -- a 8 de maio tu te levantarás. A visão desapareceu lentamente e, após alguns minutos de obscuridade, a lâmpada se acendeu sozinha"
( ! ).
     "Diante disso, o Sr. Magnin, de acordo com os médicos, dá passes magnéticos que acalmam as dores e trazem um pouco de sono à doente. A 8 de março a doente conta a seu novo médico, Sr. Magnin, que via diante de si uma linda senhora; depois seu busto se acalma, ela se move e vira a cabeça, faz esforços para se sentar, ficando perfeitamente ereta, sentada no leito. O Sr. Magnin então pergunta à linda senhora (que ele não via): -- Se sois vós quem aí estais, tendes poder para fazer a doente andar? A doente ergue lentamente a perna direita, depois a perna esquerda, apóia-se contra o leito e faz duas vezes a volta à cama. Pouco a pouco a expressão muda; há uma verdadeira transfiguração. -- Não creio alterar a verdade, diz o Sr. Magnin, ao dizer que vi uma pálida auréola circundando a cabeça da doente. Depois, a dois passos do seu leito, o busto se curvou, a cabeça tornou a pender e as pernas se dobraram. O Sr. Magnin amparou-a em seus braços e a recolocou no leito."
     "A 16 de março dormiu sete horas. Disse que a sua amiguinha lhe mandara estender as mãos que tocara, tendo ela então sentido uma força nova. Escreveu depois uma carta, o que não acontecia havia 23 meses."
     "Cessaram as hemoptises. Em 15 de maio estava definitivamente curada! Algum tempo depois, casou-se e teve dois filhos."

     "Detenhâmo-nos um instante nesta história extravagante. Em primeiro lugar, ela é autêntica, pois não se pode acusar o Sr. Magnin de mentiroso. Conheço-o passoalmente e sei que ele é de uma honestidade escrupulosa e sua sagacidade de observador e de crítico é incontestável. É preciso, pois, aceitar os fatos tais como ele os relata."
     "1º -  Uma doente cujos pulmões estão tuberculosos, que tem uma lesão óssea da coluna vertebral e uma paraplegia devida a uma compressão medular (mal de Pott -- tuberculose vertebral), curada em 3 meses e curada completamente; os 4 médicos que a examinaram não hesitaram no diagnóstico e num prognóstico rapidamente fatal. Ela estava, pois, absolutamente condenada , e, no estado atual da ciência médica, não havia dúvida de que jamais se pudesse salvar um doente tão grave."
     "2º -  A presença (muito hipotética no entanto) da linda senhora (uma alucinação evidente) teve conexão com a cura. A Srta. B. ouviu-a, viu sua mão carregando uma luz e sentiu mesmo o seu contato. (Sim, foi sem dúvida uma alucinação. Mas a palavra alucinação é bem depressa empregada. É uma alucinação bem singular, pois ela indicou a cura inacreditável. E, como diz o Sr. Magnin, a descrição que a Srta. B. fêz da linda senhora parece concordar com uma personalidade, já falecida, da família dele próprio)."
     "3º -  Que dizer da pálida auréola que o Sr. Magnin viu em redor da cabeça da doente? Teria sido também uma alucinação do próprio Sr. Magnin?"
    
     "Se se quisesse, a toda força, encontrar explicações racionais desses fatos estranhos, seríamos forçados a dizer:"
     "1º -  Que os médicos diagnosticaram mal de Pott, quando era apenas histeria ( ! )"
     "2º -  Mesmo atacados de mal de Pott e de tuberculose pulmonar, os doentes algumas vezes saram (em 3 meses?)."
     "3º -  A linda senhora não passa de imaginação da Srta. B.."
     "4º -  A auréola não passa de alucinação do Sr. Magnin."

     "Mas vê-se imediatamente a que ponto essas quatro suposições são absurdas. Mais vale reconhecer francamente que nada compreendemos."    





sábado, 8 de setembro de 2012

78) Manifestações paranormais entre os povos selvagens

Ernesto Bozzano
     
     Este é o título de mais um trabalho do pensador italiano Ernesto Bozzano, que o astrônomo Flammarion alcunhou, certa vez, de "o laborioso analista dos fenômenos psíquicos", versando sobre os fenômenos paranormais que ocorrem entre os povos selvagens, tal como acontecem entre os povos civilizados, e que não são frutos de "superstições indígenas", como imaginam alguns antropólogos e sociólogos, mas resultado de observações de fatos paranormais autênticos que se verificam no seio de todos os povos, sejam eles civilizados, bárbaros ou selvagens, antigos e atuais. O filósofo italiano inicia o seu trabalho afirmando que "bastará consultar as obras dos mais eminentes antropólogos, sociólogos e missionários que viveram, longo tempo, entre os povos selvagens, para verificar que todos esses autores reconhecem, de comum acordo, que a crença na sobrevivência do espírito humano é universal."
     Bozzano cita o antropólogo E. B. Tylor, o qual observa, em sua obra Primitive Culture que "a fórmula mínima para definir uma religião consiste na crença de entidades espirituais, que se encontra no meio das mais atrasadas raças humanas com as quais temos conseguido entrar em relações íntimas". Acrescenta que "essas entidades são as almas que sobreviveram à morte do corpo." E continua: "tal crença é a base fundamental de todas as religiões, a partir das religiões dos selvagens para chegar às dos povos civilizados; constitui, aliás, a religião ou filosofia mais antiga e universal."
     O antropólogo Andrew Lang, em seu livro The Making of Religion, comparou as manifestações que se realizam entre os povos primitivos com as que se verificam entre entre os civilizados, quer sejam espontâneas, quer produzidas experimentalmente, e assegura que a melhor prova de tais fenômenos se encontra na admirável concordância com as descrições análogas, vindas de diferentes lugares e diferentes épocas. E conclui, apud Bozzano: "Quando as circunstâncias que nos relatam os exploradores, assim os antigos como os modernos, instruídos ou ignorantes, místicos e céticos, concordam em sua modalidade de manifestação, temos o melhor critério de prova que a Antropologia pode fornecer. E acrescente-se ainda que, aplicando o método da análise comparada aos diferentes povos, concluímos que os fenômenos psíquicos são os mesmos por toda parte, e igual, por toda parte, a crença na sobrevivência por eles firmada. Não se distancia, ainda, da dos tempos modernos, a crença dos povos antigos no que tange à gênese de tais fenômenos, ou seja, que são produzidos pela alma dos que viveram na Terra."
     "Esses fenômenos", diz Bozzano, "idênticos, quaisquer que sejam as épocas e as regiões, vieram reforçar a certeza da sobrevivência do espírito humano e a possibilidade de comunicação entre os vivos e os desencarnados."

     Grant Allen afirma em sua obra The Evolution of the Idea of God que "a religião contém, em si própria, um elemento infinitamente mais antigo que a própria religião, mais fundamental e persistente que toda a  crença em Deus ou nos deuses; isto é, mais antigo mesmo que o uso da propiciação aos deuses e aos espíritos, por meio de oferendas, e este elemento é a crença na sobrevivência dos trespassados. Ora, é nessa crença universal primitiva que se fundaram todas as religiões."
     Globet d'Alviella declara em seu livro Hibbert Lecture que "as descobertas desses vinte e cinco últimos anos mostraram, de maneira decisiva, que na época do mamute já o homem praticava os ritos fúnebres, cria na sobrevivência da alma."
     Brinton em  Religions of Primitive Peoples nos diz que "há religiões, por tal forma rudimentares, que não têm altares, nem templos, nem ritos; mas é impossível encontrar uma só religião rudimentar cuja crença não repouse na existência de entidades espirituais que se comunicam com os homens."
     Para Huxley, em Lay Sermons and Adresses, "há povos selvagens sem Deus, mas não os há sem a existência dos espíritos."
     Para Powers, em Tribes of California, em que trata dos índios da Califórnia, "estes não têm nenhuma ideia de um Ser Supremo, mas creem na existência dos espíritos, ou seja, nas almas dos homens que habitaram o nosso planeta."

     Para César de Vesme, em Histoire du Spiritualisme Expérimental, "a crença na alma, na sobrevivência, nos espíritos, impôs-se ao homem, bom ou mau grado seu, independentemente de seus desejos, pela observação de fatos ocorridos em todos os tempos e lugares, fatos de que iremos nos ocupar -- eis tudo."  

     Vejamos os capítulos da superdocumentada obra do filósofo italiano, considerado "o grande mestre da ciência da alma", citando diversos fatos paranormais ocorridos entre os povos selvagens, narrados por exploradores e missionários que viveram entre eles:

Cap. 1 -   Pancadas e Quedas, Movimento de Objetos a Distância (Telecinésia), Levitação Humana.

Cap. 2 -   Transmissão do Pensamento e Telepatia de um Modo Geral.
Cap. 3 -   Clarividência no Presente e no Futuro.
Cap. 4 -   Fenômenos de Assombramento.
Cap. 5 -   Fenômenos de Transporte.
Cap. 6 -   Fascinação Hipnótica e Sortilégios.
Cap. 7 -   A Prova do Fogo.
Cap. 8 -   Feiticeiros-Médicos e seus Sistemas de Cura.
Cap. 9 -   Duplo Psíquico, Desdobramento, Bilocação.
Cap. 10 - Sessões Mediúnicas com Telecinésia, Vozes Diretas, Xenoglossia, Materializações e Identificações de Espíritos.
Apêndice - Notáveis Intuições Filosóficas e Científicas entre os Selvagens Africanos.

     A título de exemplo, citarei um único fato dos vários que a obra em apreço contêm, resumindo-o tanto quanto possível, dada a impossibilidade de reproduzi-lo integralmente, devido à sua extensão. Vejamos:

     O fato se passa em 1759, em território norteamericano (antes da guerra de independência), quando os EUA ainda eram uma colônia inglesa. O narrador é um aventureiro inglês, Alexandre Henri, que fora feito prisioneiro pelos índios. Conta ele que um missionário e reverendo inglês, Sir William Johnson, enviara amistosas mensagens aos índios que o mantinham cativo, convidando seus chefes, instalados no Salto Santa Maria, a virem concluir a paz no forte do Niágara. Tratando-se de uma determinação de alta importância, fizeram os índios solenes preparativos para evocar e consultar o Espírito de um antigo chefe falecido, a Grande Tartaruga, conhecido na tribo como "aquele que nunca mentia", pela sua retidão de caráter.
     Omito os preparativos para a consulta ao Espírito, demasiadamente extensos (mas que podem ser lidos, "in totum", no livro de Bozzano), para chegar ao momento em que o sacerdote (médium) anuncia a presença da Grande Tartaruga, e o seu consentimento em responder às perguntas. Indagaram, então, se os ingleses estavam preparados para fazer a guerra ou a paz, e se no forte Niágara havia muitas fardas vermelhas. Agitou-se a tenda durante alguns minutos e, com um grito terrível, o sacerdote anunciou que a Grande Tartaruga havia partido. Foi geral a consternação. Mas, um quarto de hora depois, voltava ela. Durante sua ausência -- informou o médium -- franqueara o lago Huron, fora ao forte Niágara e, de lá, a Montreal. No forte Niágara havia poucos soldados; mas descendo o S. Lourenço até Montreal, notara o rio guarnecido de embarcações cheias de soldados. O Espírito topara com eles quando rumavam para combater os índios (naquela época, havia várias tribos indígenas em terras norteamericanas).
     O chefe perguntou então se, no caso em que os índios aceitassem o convite de Sir William Johnson, se este os receberia como amigos. Grande Tartaruga respondeu que Johnson encheria suas canoas com presentes, tantos quanto elas pudessem conter, e que cada um voltaria em segurança para a aldeia. A alegria foi grande. O narrador conservou-se à parte, como simples espectador.
     Realizou-se a expedição dos chefes da tribo ao forte Niágara, e as suas consequências, referidas na História de Drake, ajustam-se inteiramente às promessas feitas por "aquele que nunca mentia". Henri foi bem tratado pelos índios e libertado no final.

Obs. minha: Vali-me de uma edição em espanhol da obra do mestre italiano. Contudo, existe uma edição em português do livro, sob o título "Povos Primitivos e Manifestações Paranormais", publicado pela Editora do Conhecimento.