sexta-feira, 4 de junho de 2010



61)30 Abr 2010
Antes do seu desencarne, teria Rui Barbosa aderido ao Espiritismo?

Na "Oração aos Moços", "ato de fé", "conselho de pai a filhos", testamento de uma carreira, em que, diz ele, "estou-vos abrindo o livro da minha vida", escrita nas antevésperas do seu desencarne e, por isso mesmo, lida por Reinaldo Porchat em cerimônia pública, há uma passagem em que a eloquência indiscutivelmente espiritualista de Rui Barbosa dá conselhos aos colegas e afilhados em termos inequívocos de quem tomou conhecimento da sobrevivência humana, de acordo com a Doutrina Espírita. Abramos a "Oração aos Moços", 9ª ed. FORENSE, Rio, pág. 10:

A maior de quantas distâncias logre a imaginação conceber, é a da morte; e nem esta separa entre si os que a terrível apartadora de homens arrebatou aos braços uns dos outros.
Quantas vezes não entrevemos, nesse fundo obscuro e remotíssimo, uma imagem cara? Quantas vezes não a vemos assomar nos longes da saudade, sorridente ou melancólica, alvoroçada ou inquieta, severa ou carinhosa, trazendo-nos o bálsamo ou o conselho, a promessa ou o desengano, a recompensa ou o castigo, o aviso da fatalidade ou os presságios de bom agouro?
Quantas nos não vem conversar, afável e tranquila, ou pressurosa e sobressaltada, com o afago nas mãos, a doçura na boca, a meiguice no semblante, o pensamento na fronte, límpida ou carregada, e lhe saímos do contato, ora seguros e robustecidos, ora transidos de cuidado e pesadume, ora cheios de novas inspirações, e cismando, para a vida, novos rumos?

Quantas outras, não somos nós os que vamos chamar esses leais companheiros de além-túmulo, e com eles renovar a prática interrompida, ou instar com eles por um alvitre, em vão buscado, uma palavra, um movimento do rosto, um gesto, uma réstia de luz, um traço, do que por lá se sabe, e aqui se ignora? (negrito meu).

O Dr. Sérgio Valle, em seu livro, hoje raro, "Silva Mello e os Seus Mistérios" (Editora LAKE, 2ª edição, São Paulo, 1959), fêz uma visita à casa de Rui Barbosa, tombada pelo Patrimônio Histórico, situada na rua São Clemente, Botafogo, RJ, e cita os livros que o grande jurisconsulto e filólogo baiano leu, com vários textos sublinhados em vermelho, para escrever o texto acima. Vejamos a relação:

William Crookes: Les Nouvelles Expériences sur la Force Psychique.
Charles Richet: Traité de Metapsychique.
Sir Oliver Lodge: Raymond or Life and Death; The Proofs of Life After Death; La Vie et la Matière
Alexander Aksakof: Animisme et Spiritisme.
Ernesto Bozzano: Les Phénomènes de Hantise.
Frederic Myers: Les Hallucinations Telépathiques.
Conan Doyle: The New Revelation.
Léon Denis: Les Problèmes de L'Être et de la Destinée.
Alfred Russel Wallace: La Place de L'Homme dans L'Univers
Camille Flammarion: Dieu dans la Nature; L'Inconnu et les Problèmes Psychiques; La Mort e son Mistère (3 volumes); Recits de L'Infini; Uranie.

Como vimos, para escrever um pequeno e belíssimo texto, eivado de considerações autenticamente espíritas, Rui Barbosa leu alguns dos maiores cientistas e filósofos espíritas de todos os tempos.
Rochester

Wera Krijanowskaia


60)29 Abr 2010
Uma reapreciação histórica da figura de Moisés, feita pelo Espírito do Conde de Rochester.

Convém esclarecer que as obras do Espírito do Conde de Rochester, psicografadas pela médium russa Wera Krijanowsky (ou Krijanowskaia, como querem alguns), escritas no final do século dezenove e início do vinte, abrangem, ao que se sabe, 57 obras, sob a forma de romances de fundo espiritista. Dessas, graças principalmente aos esforços de espíritas brasileiros, admiradores da obra do autor espiritual, que viajaram pelo mundo todo (principalmente o eslavo) e conseguiram recuperar muitas que se julgavam perdidas, em virtude da destruição causada por duas guerras mundiais, foram traduzidas (até do russo e do polonês, entre outras línguas) e publicadas 42 obras, dando-se 15, ao que parece até agora, como perdidas.
A jovem médium era filha de família russa muito distinta. Não obstante ter recebido no Instituto Imperial de S. Petersburgo uma sólida instrução, ela não se aprofundou em nenhum ramo de conhecimentos. Sua mediunidade, segundo se pode saber pelas revistas europeias da época, consistia principalmente na escritura mecânica, e o automatismo lhe era tão caracterizado que a sua mão traçava as palavras com uma rapidez vertiginosa, com uma inconsciência completa das ideias contidas em seus escritos. Além disso, as narrações que lhe eram assim ditadas denotavam tal conhecimento da vida e dos costumes das mais antigas civilizações do passado, traziam, em suas minúcias, tal cunho de feição da época e de veracidade histórica, que será difícil ao leitor não lhes reconhecer a autenticidade. Sábios e estudiosos de antigas civilizações, como o prof. alemão G. Ebers, afirmaram que seria impossível, ao historiador mais erudito, estudar, simultaneamente e a fundo, épocas e meios tão diferentes, com conhecimento de causa, como as civilizações assíria, babilônica, egípcia, fenícia, grega e romana; costumes tão dessemelhantes como os da França de Luiz XI e da Renascença; em uma palavra, seria impossível, diz Ebers, ao historiador mais fecundo, passar, com notável facilidade e fidelidade histórica, de Moisés a Carlos IX, ainda mais quando se sabe que a médium traçava os seus escritos com incrível celeridade.
Embora "A Vingança do Judeu" seja considerada a sua obra prima, um lugar de grande destaque é ocupado também pela sua obra "O Faraó Mernephtah" (ed. da LAKE). Nela, Rochester afirma ter sido, na Terra, o citado Faraó, que foi derrotado por Moisés, na célebre fuga dos judeus do seu cativeiro no antigo Egito. (Esses fatos remontam a cerca de 1200 anos a.c.). O autor espiritual afirma que Moisés era filho biológico da jovem princesa Thermutis (filha do Faraó) com um judeu chamado Ithamar (embora a Bíblia diga que era filho adotivo da princesa), e, pois, neto do Faraó. Nele, entretanto, predominavam nitidamente os traços fisionômicos do hebreu (judeu) clássico, e não deixava de ser um filho bastardo, fruto da união de uma nobre egípcia com um escravo. Quem quiser aquilatar o valor da obra, concordando ou não com ela, deverá ler o original, facilmente encontrado nas boas livrarias. Aqui, entretanto, devo cingir-me a fazer duas citações da mencionada obra. Moisés, apesar dos seus traços, sob a discreta proteção da mãe, que muito poucos sabiam ser sua mãe verdadeira (só o Faraó, um médico de sua estrita confiança, e a dama de companhia da princesa sabiam), foi educado nas melhores escolas do Egito e frequentava, desde pequeno, a alta corte egípcia, sendo tratado então com carinho pelo próprio Faraó. Mas qual a sua verdadeira missão? Demos a palavra, agora, a Rochester.

"A missão divina de Moisés era conquistar, com brandura e meiguice, a amizade de Mernephtah e dominar, assim, esse homem violento, mas generoso. Por intermédio do Faraó, deveria aliviar pacientemente a sorte dos hebreus, prepará-los para a liberdade e, chegado o momento favorável, obter de Mernephtah a sua libertação. O ensejo de tornar-se árbitro da situação não lhe teria faltado, no momento oportuno"
( - )
"Para disciplinar o turbulento e desleixado povo hebreu daquela época, decretou leis. Aqui, faço inteira justiça à sabedoria e profundeza do seu espírito, que soube reunir num resumo exato a essência da sabedoria da Índia e do Egito, e que, pelos dez mandamentos e a crença num único Deus, estabeleceu as bases das leis fundamentais da moralidade, que se tornaram herança de todos os povos cristãos. Nisso, o grande missionário foi digno do seu mandato divino; mas, onde o homem político sobrepõe-se ao profeta, surge a sombra. Ele sabia que a união faz a força; deu, pois, às hordas vacilantes que conduzia, um código que as galvanizou num povo indestrutível. Entretanto, essas leis que ele afirmava ter recebido diretamente do Criador Eterno, são excessivamente crueis; consagram a pilhagem, a carnificina, a pena de maior vingança até a quarta geração, e o ódio a tudo que não seja hebreu; elas fizeram do povo judeu inimigo de tudo que não seja dele, buscando a vantagem fácil a expensas de outrem, recordando que os roubos ordenados pelo Eterno, por ocasião da saída do Egito, o haviam enriquecido sem esforço".
"Tudo quanto acabo de referir, bem o sei, levantará uma tempestade contra mim, espírito audacioso, que ousou erguer a ponta do lendário veu que encobre o grande legislador hebreu, para revelar, por baixo do Moisés profeta, o ambicioso candidato a um trono. Caros leitores, não vos esqueçais, porém, de que o escritor destas linhas é Mernephtah, o infeliz Faraó que lutou contra esse homem férreo, com desespero do soberano que assiste à destruição da prosperidade do seu povo, mediante inauditas calamidades e comoções políticas sem precedentes na história".
"Submetido pelo terror, quase louco pela impossibilidade em que me encontrava de compreender o modo pelo qual Moisés agia, na missão divina de que se dizia possuidor, e em que eu não acreditava, cedi ; mas, após a morte do Faraó, meu espírito sondou avidamente a vida e as ações do antagonista que me vencera. Diante do olhar desabusado do meu espírito, o grande profeta empalidece, não restando senão alguns raios divinos; dele apenas fica, sob o grande sábio, o hábil e ambicioso político. É assim que ele me ressurge na memória, ao vos oferecer estas páginas de um longínquo passado".
No final da obra, Rochester diz:

"É verdade que Moisés pregou a existência de um Deus único e, pelos dez mandamentos, estabeleceu uma base para o futuro edifício da cristandade, mas também lhe pertencerá a responsabilidade de ter feito do Supremo Criador do Universo, do Ser infinitamente grande, sábio e misericordioso, o Deus parcial, vingativo e sanguinário do Velho Testamento".

Aqui, seria conveniente dizer que alguns espiritualistas (entre os quais não me incluo), não concordam com as opiniões do autor, embora respeitem o seu ponto de vista.
Carlos Imbassahy


59)29 Abr 2010
A Bíblia (Velho Testamento) não representa a Palavra de Deus.

Extraio os trechos abaixo do livro do escritor Carlos Imbassahy, "À Margem do Espiritismo"
(2ª ed., FEB, 1950, pág. 229). Diz o eminente polemista e estudioso do Espiritismo:

Acha-se em Números, cap. 31:vers. 1 em diante - "Disse Jeová a Moisés: Vinga os filhos de Israel dos Medianitas". E se Jeová o disse, Moisés melhor o fêz. Armou os homens para a guerra a fim de executarem a vingança de Deus. "E eles pelejaram comtra Midian, como Jeová ordenou a Moisés e mataram todos os homens". E mataram também o rei dos Medianitas, e Balaão, filho de Beor. E mais: "Os filhos de Israel levaram cativas as mulheres de Midian com seus pequeninos; e despojaram-nos de todos os seus rebanhos e de todos os seus bens. Queimaram-lhes a fogo todas as cidades em que habitavam e todos os acampamentos".
Parece que depois do terrível saque e da pavorosa matança, a ira de Deus e a de Moisés deveriam estar aplacadas. Pois não se saciaram. Moisés ficou furioso diante da ninharia da pilhagem e da fraqueza do morticínio: "Indignou-se Moisés contra os oficiais do exército, capitães dos milhares e capitães das centenas". E não era para menos. Uma vingança como a ordenava o Senhor deveria ser muito pior. Uma carnificina assombrosa. E Moisés intimou: "Agora matai a todos os machos entre os pequeninos e matai as mulheres que conheceram homem, e quanto às meninas deixai-as viver para vós".
Não será, porém, de admirar esse gosto pelas batalhas, esse degolamento de vencidos, essa sede de sangue, quando, segundo Êxodo, 15:3, "Jeová é homem de guerra".
Fêz ele os homens e o mundo e achou, no momento, que estava tudo muito bem feito. E era natural que o achasse. Tratava-se do Onisciente, do Onipotente. Engano, puro engano, porque depois "viu que era grande a maldade humana e então se arrependeu de ter feito o homem" (Gênesis, 6:5 a 8). Aliás, toda a sua vida bíblica é uma série de arrependimentos. Como qualquer mortal de mau gênio e maus bofes, enche-se constantemente de ira. De uma feita, Moisés chamou-o às falas: "Por que se acende a tua ira contra o teu povo?". E o aconselha, ou melhor, ordena: "Volve-te do furor da tua ira e arrepende-te deste mal contra teu povo". (Êxodo, 32:11 a 14). E vai daí, Jeová caiu em si, viu que tinha errado e, graças a Moisés, voltou atrás de suas maldades.
E ele se arrependia tanto que chegou a cansar. Como se vê em Jeremias, 15:1 a 6, ameaça fazer coisas medonhas e confessa "que está cansado de ter piedade".
Moisés desce do Sinai com as tábuas da lei, onde se dizia -- não matarás -- e logo, para exemplificar, manda matar três mil pessoas e pede a bênção para os assassinos. Pois é ainda esse quem detém o braço do Criador nas suas inomináveis violências. Aliás, foi o próprio Jeová quem, propositadamente, endureceu o coração do Faraó e de seus oficiais, para que pudesse fazer os Seus sinais diante deles (Êxodus, 10-1).
Deus ordena mais, "que se escravizem os que se entregarem, ainda mesmo por meio de paz, sem pelejarem". (Deuteron., 20:10 a 11). Nas cidades em que pelejarem manda assassinar todos, não devendo ficar coisa alguma que tenha fôlego (ídem, 20:12 a 16). Os pais devem levar os filhos desobedientes à morte (ídem, 21:18 a 21). Josué fêz parar o Sol e a Lua, quase um dia inteiro, para que os israelitas tivessem tempo de trucidar seus inimigos amorreus (Josué, 10:12 a 14). Um absurdo biológico: Jonas passa três dias no ventre de uma baleia e depois é vomitado em terra (Jonas, 1-17 e 2-1 a 10).

Convenhamos: Hitler, Napoleão, Átila, César, e outros foram muito mais humanos.

Para encerrar, e por tudo que foi dito acima, gostaria de acrescentar três pontos:

1º) Imbassahy nos deu uma das melhores definições que conheço acerca do Espiritismo:
"O Espiritismo é uma doutrina científica e filosófica que não se baseia em anacrônicos textos "pseudo-sagrados" (cujas interpretações, aliás, variam ao infinito, conforme a posição religiosa ou doutrinária de cada um), mas nos fatos cientificamente comprovados (por eminentes cientistas de diferentes países), e nos ensinamentos morais de Jesus, confirmados e ampliados nas obras de Allan Kardec, codificando o que os espíritos superiores lhe transmitiram."

2º) É um engodo, puro engodo de certas religiões e seitas, afirmarem que a Bíblia (refiro-me especificamente ao Velho Testamento) é a palavra de Deus; pode ser a palavra de um Nero, de um Hitler, mas não de Deus. A palavra de Deus encontra-se basicamente nos Evangelhos de Jesus, que substituiu toda a lei mosaica (baseada no "olho por olho, dente por dente"), pela lei do Amor: "Ama a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a ti mesmo; aí estão toda a Lei e os profetas" (grifo meu). "Não façais aos outros o que não quereis que eles vos façam". "Amai-vos uns aos outros como eu vos amei". "Ouvistes o que foi dito aos antigos: olho por olho, dente por dente; eu porém vos digo: não resistais ao homem mau, mas a quem te bater na face direita, oferece-lhe também a outra"; e ao que quer demandar-te em juízo e tirar-te a túnica, larga-lhe também a capa; e se alguém te obrigar a caminhar mil passos com ele, caminha mais dois mil", etc..

3º) A crença no Deus parcial (pró-hebreus), vingativo e rancoroso do Velho Testamento é o que leva os judeus a praticar a sua política de isolamento religioso, e na crença de um Cristo verdadeiro, que virá no futuro para lhes oferecer um lugar de primazia na história da humanidade (o povo privilegiado, escolhido pelo próprio Jeová).
Claude Bernard


58)23 Abr 2010
O "perispírito" ou "duplo psíquico" representa a "ideia diretriz", do fisiologista Claude Bernard.

Demos a palavra a Claude Bernard, um dos maiores fisiologistas de todos os tempos:

"Se fosse preciso definir a vida, eu diria: a vida é a criação. O que caracteriza a máquina viva não é a natureza de suas propriedades físico-químicas, é a criação dessa máquina junto de uma ideia definida. Esse agrupamento se faz em virtude de leis que regem as propriedades físico-químicas da matéria; mas o que é essencialmente do domínio da vida, o que não prtence nem à Física, nem à Química, é a ideia diretriz dessa evolução vital.
Há como um desenho vital que traça o plano de cada ser, de cada órgão, de sorte que, considerado isoladamente, cada fenômeno do organismo é tributário das forças gerais da Natureza; tomadas em sua sucessão e em seu conjunto, parecem revelar um liame especial; dir-se-iam dirigidos por alguma condição invisível, na rota que seguem, na ordem que os encadeia.
A vida é uma ideia; é a ideia do resultado comum, ao qual estão associados e disciplinados todos os elementos anatômicos; é a ideia da harmonia que resulta do seu concerto, da ordem que reina em suas ações.
Vemos, na evolução do embrião, surgir um simples esboço do ser antes de qualquer organização. Os contornos do corpo e dos órgãos, a princípio, são meros delineamentos, começando pelas construções orgânicas provisórias, que servem de aparelhos funcionais e temporários do feto. Até então, nenhum tecido se distingue. Toda a massa é constituída apenas por células plasmáticas e embrionárias. Mas, nesse esboço vital, está traçado o desenho ideal de um organismo ainda invisível para nós, estando já designados, a cada parte e a cada elemento, seu lugar, sua estrutura, suas propriedades. Onde devem estar vasos sanguíneos, nervos, músculos, ossos, as células embrionárias se transformarão em glóbulos de sangue, em tecidos arterial, venoso, muscular, nervoso e ósseo." (Claude Bernard, apud Gabriel Delanne, "A Reencarnação", ed. FEB, 2006, trad. de Carlos Imbassahy).

A "ideia diretriz" do notável fisiologista nada mais é que o "perispírito" (Kardec) ou "duplo psíquico" (Lombroso), que contem a rota ideal, a trama invisível, a "forma-arquétipo" (Bozzano), o "modelo organizador biológico" (H. G. Andrade). Vejamos o que, a este respeito, diz Bozzano:

"A ideia-diretriz, de Claude Bernard, que regula a origem e a evolução das espécies vegetais, animais e humanas no ambiente terrestre, exterioriza-se numa forma-arquétipo invisível (aos nossos olhos), que precede a criação somática, cujas fases ulteriores de desenvolvimento são igualmente precedidas pelas formas-arquétipo correspondentes e destinadas a servirem de modelo, em torno do qual deverá condensar-se, gradualmente, por lei de afinidade, a matéria viva, que atinge a individualidade vegetal, animal e humana graças à nutrição fisiológica," (Ernesto Bozzano, "Pensamento e Vontade", ed. FEB, 1991).

Voltemos à Gabriel Delanne, na obra já citada:

"Se perguntarmos onde o perispírito pode adquirir suas propriedades funcionais, parece lógico supor que ele as fixou em si, no curso de suas evoluções terrestres, passando, sucessivamente, por toda a fieira da série animal, subindo, durante milhares ou milhões de anos, todos os degraus da escala zoológica, integrando, em sua substância indestrutível, as leis cada vez mais complicadas que lhe permitem animar, automaticamente, organismos cada vez mais complexos, das formas mais simples ao homem. É uma gradação sucessiva e uma evolução contínua.
Pode-se conceber, então, que esse gigantesco progresso evolutivo não é devido a causas exclusivamente externas, mas, primordialmente, ao psiquismo interior, que procura quebrar a ganga da matéria, e faz esforços ininterruptos por amortecê-la e permitir às suas faculdades entrarem em relação cada vez mais íntima com a natureza exterior. A criação dos sentidos, depois a de órgãos cada vez mais aperfeiçoados, seria o resultado de um esforço reiterado, e não o produto de felizes acasos, como querem os materialistas.....
Uma vez que o perispírito possui a faculdade, após a morte, de materializar-se, reconstituindo, integralmente, o organismo físico que aqui possuía, somos levados a supor que, no instante do nascimento, é ele que forma seu invólucro corporal, o qual não passa de uma materialização estável e permanente, enquanto nas sessões experimentais ela é apenas temporária, porque produzida fora das vias normais da geração." (Gabriel Delanne, "A Reencarnação").
Léon Denis


57)19 Abr 2010
Onde Reside Hoje os Anseios do Homem de Nazaré, para Léon Denis

"Não é nas igrejas tradicionais, nem nas instituições do pretenso "direito divino" que se encontra, hoje, a seiva pura do pensamento do meigo nazareno. O pensamento de Jesus só vive hoje na alma do povo simples, nesses milhões de trabalhadores que lutam e sofrem, diuturnamente, para levar às suas famílias, com honestidade, o pão de cada dia, muitos dos quais, aliás, não se dizendo ou não se acreditando cristãos, trazem, inconscientemente em si, o ideal sonhado por Jesus. É aí que se encontra essa grande corrente humanitária, cuja nascente está no alto do Calvário, e cujas ondas nos arrastam para um futuro que jamais conhecerá as vergonhas da miséria, da prostituição e da ignorância". (Léon Denis, Socialismo e Espiritismo, Editora O Clarim).


56)19 Abr 2010
Uma bela página de Léon Denis sobre a missão do Cristo (2)

Algumas vezes, o Cristo resumia as verdades eternas em imagens grandiosas, em traços brilhantes. Nem sempre os apóstolos o compreendiam, mas ele deixava aos séculos e aos acontecimentos o cuidado de fazer frutificar esses princípios na consciência da Humanidade, como a chuva e o Sol fazem germinar a semente que caiu na Terra. É nesse sentido que assim se exprimiu: "O ceu e a Terra passarão, porém não as minhas palavras."
Jesus dirigia-se pois, simultaneamente, ao espírito e ao coração. Aqueles que não tivessem podido compreender Pitágoras e Platão, sentiam suas almas comoverem-se aos eloquentes apelos do Nazareno. É por aí que a doutrina cristã domina todas as outras. Para atingir a sabedoria, era preciso, nos santuários do Egito e da Grécia, franquear os degraus de uma longa e penosa iniciação, ao passo que pela bondade e caridade todos podiam tornar-se bons cristãos e irmãos em Jesus.
Mas, com o tempo, as verdades transcendentais se velaram. Aqueles que as possuíam foram suplantados pelos que acreditavam saber, e o dogma material substituiu a pura doutrina. Dilatando-se, o Cristianismo perdeu em valor o que ganhava em extensão.
A ciência profunda de Jesus vinha juntar-se à potência energética do iniciado superior, da alma livre do jugo das paixões, cuja vontade domina a matéria e impera sobre as forças sutis da Natureza. O Cristo possuía a dupla-vista; seu olhar sondava os pensamentos e as consciências; curava com uma palavra, com um sinal, ou mesmo só com a sua presença. Eflúvios benéficos se lhe escapavam do ser, e, à sua ordem, os maus espíritos se afastavam. Comunicava-se facilmente com as potências celestes e, nas horas de provação, alentava desse modo a força moral que lhe era necessária em sua viagem dolorosa. No Monte Tabor, seus discípulos, deslumbrados, o veem conversar com Moisés e Elias. É assim mesmo que mais tarde, depois de crucificado, Jesus lhes aparece, materializado, na irradiação do seu corpo psíquico, desse corpo a que S. Paulo se refere nos seguintes termos: "Há, em cada homem, um corpo animal e um corpo espiritual." (1ª Epíst. aos Coríntios, cap. XV, 5 - 8). A existência desse corpo espiritual (ou duplo psíquico) parece demonstrada pelas experiências da Parapsicologia.
Não podem ser postas em dúvida tais aparições, pois explicam por si sós a persistência da ideia cristã. Depois do suplício do Mestre e da dispersão dos discípulos, o Cristianismo estava moralmente morto. Foram porém as aparições e as conversas de Jesus que restituíram aos apóstolos sua energia e sua fé, tão vívidas que os fizeram sofrer as maiores perseguições e as maiores torturas a fim de espalhar, mundo afora, a ideia cristã.
( - )
No séc. lV, o Cristianismo foi considerado a religião oficial do império romano pelo Imperador Constantino, um dos grandes criminosos da história, que, no seu íntimo, nada tinha de cristão (como demonstram as suas ações), mas que se utilizou da religião cristã, em franca ascensão, para consolidar o poder romano, admitindo a igreja de Roma como a única fiel depositária dos ensinamentos cristãos, e massacrando as outras (nessa época havia várias igrejas cristãs) a ferro e fogo.
Foi a partir de então que os sacerdotes romanos perderam de vista a luz que Jesus tinha trazido a este mundo, e recaíram na obscuridade. A noite que quiseram para os outros fêz-se neles mesmos. O templo deixou de ser, como nos tempos antigos, o asilo da verdade. E esta abandonou os altares para buscar um refúgio oculto. Desceu às classes pobres; foi inspirar humildes missionários, apóstolos obscuros que, sob o nome do Evangelho de S. João, procuravam restabelecer, em diferentes pontos da Europa, a simples e pura religião de Jesus, a religião da igualdade e do amor. Porém estas doutrinas foram asfixiadas pela fumaça das fogueiras, ou afogadas em lagos de sangue.

Estes excertos (1 e 2) foram por mim extraídos de dois livros de Léon Denis: Depois da Morte e Cristianismo e Espiritismo.
Léon Denis


55)19 Abr 2010
Uma bela página de Léon Denis sobre a missão do Cristo (1)

Um pouco antes da era atual, à proporção que o poder de Roma cresce e se estende, vê-se a doutrina secreta recuar, perder a sua autoridade. São raros os verdadeiros iniciados. O pensamento se materializa, os espíritos se corrompem. A Índia fica como adormecida num sonho: extingue-se a lâmpada dos santuários egípcios, e a Grécia, assenhoreada pelos retóricos e pelos sofistas, insulta os sábios, proscreve os filósofos, profana os Mistérios. Os oráculos ficam mudos. A superstição e a idolatria invadem os templos. E a orgia romana se desencadeia pelo mundo, com suas bacanais, sua luxúria desenfreada, seus inebriamentos bestiais. Do alto do Capitólio, a prostituta saciada domina povos e reis. César, imperador e deus, se entroniza numa apoteose ensanguentada !
Entretanto, nas margens do Mar Morto, surge um Homem, uma Alma bastante vasta, tão superabundante de luz e de amor, para nela própria sorver os elementos de sua missão. Jamais a Terra viu passar maior Espírito. Uma serenidade celeste envolvia-lhe a fronte. Nele se uniam todas as perfeições para formar um tipo de pureza ideal, de inefável bondade.
Há em seu coração imensa piedade pelos humildes, pelos deserdados. Todas as dores humanas, todos os gemidos, todas as misérias encontram nele um eco. Para acalmar esses males, para secar essas lágrimas, para consolar, para curar, para salvar, ele irá ao sacrifício da própria vida oferecer em holocausto a fim de reerguer a Humanidade. Quando, pálido, se dirige para o Calvário, e é pregado ao madeiro infamante, encontra, ainda em sua agonia, a força de orar por seus carrascos, e de pronunciar estas palavras que nenhum impulso de ternura ultrapassará jamais:
"Pai, perdoai-lhes, porque não sabem o que fazem !"
Entre os grandes missionários, o Cristo, o primeiro de todos, comunicou às multidões as verdades que, até então, tinham sido o privilégio de pequeno número. Para ele, o ensino oculto tornava-se acessível aos mais humildes, senão pela inteligência, ao menos pelo coração, e lhes oferecia esse ensino sob formas que o mundo não tinha conhecido, com uma potência de amor, uma doçura penetrante, uma fé comunicativa, que faziam fundir os gelos do ceticismo, eletrizar os ouvintes e arrastá-los após si.
O que ele chamava "pregar o Evangelho do reino dos ceus aos simples" era por ao alcance de todos o conhecimento da imortalidade e o do Pai comum. Os tesouros intelectuais, que os adeptos avaros só distribuíam com prudência, o Cristo os espalhava pela grande família humana, por esses milhões de seres curvados sobre a Terra, que nada sabiam do destino e que esperavam, na incerteza e no sofrimento, a palavra nova que os devia consolar e reanimar.
Essa palavra, esse ensino, ele distribuiu sem contar, e lhes deu a consagração do seu suplício e da sua morte. A cruz, esse símbolo dos antigos iniciados, que se encontra em todos os templos do Egito e da Índia, tornou-se, pelo sacrifício de Jesus, o sinal da elevação da Humanidade, tirada do abismo das trevas e das paixões inferiores, para ter enfim acesso à vida eterna, à vida das almas regeneradas.
O Sermão da Montanha condensa e resume o ensino popular de Jesus. Aí se mostra a lei moral com todas as suas consequências; nele os homens aprendem que as qualidades brilhantes não fazem sua elevação nem sua felicidade, mas que só poderão conseguir isto pelas virtudes modestas e ocultas -- a Solidariedade, a Bondade, a Justiça e o Amor.

Obs. minha: Que profunda inspiração nessas palavras do mestre Léon Denis, ele que, em sua vida, foi um grande médium inspirado! E ainda dizem que o Espiritismo não é cristão. Como negá-lo diante do texto acima? Alguém poderia escrever sob a figura e a missão do Cristo com maior fulgor?